sexta-feira, 31 de julho de 2015

CONTOS TRADICIONAIS DO POVO PORTUGUÊS - A madrasta

 
 
 
 
 

    A madrasta

 
Uma mulher tinha uma filha muito feia e uma enteada bonita como o sol; com inveja tratava-a muito mal, e quando as duas pequenas iam com uma vaquinha para o monte, à filha dava-lhe um cestinho com ovos cozidos, biscoitos e figos, e à enteada dava-lhe côdeas de broa bolorentas, e não passava dia algum sem lhe dar muita pancada. Estavam uma vez no monte e passou uma velha que era fada, e chegou-se a elas e disse:

– Se as meninas me dessem um bocadinho da sua merenda? Estou a cair com fome.

A pequena que era bonita e enteada da mulher ruim deu-lhe logo da sua codinha de broa; a pequena feia, que tinha o cestinho cheio de coisas boas, começou a comer e não lhe quis dar nada. A fada quis-lhe dar um castigo, e fez com que ela feia ficasse com a formusura da bonita; e que a bonita ficasse em seu lugar, com a cara feia.

Mas as duas pequenas não o souberam; veio a noite e foram para casa. A mulher ruim, que tratava muito mal a enteada que era bonita, veio-lhes sair ao caminho, porque já era muito tarde, e começou às pancadas com uma vergasta na própria filha, que estava agora com a cara da bonita cuidando que estava a bater na enteada.

Foram para casa, e deu de comer sopinhas de leite e coisas boas à que era feia, pensando que era a sua filha, e a outra mandou-a deitar para a palha de uma loja cheia de teias de aranha, e sem ceia.

Duraram as coisas assim muito tempo, até que um dia passou um príncipe e viu a menina da cara bonita à janela, muito triste e ficou logo a gostar muito dela, e disse-lhe que queria vir falar com ela de noite ao quintal.

A mulher ruim ouviu tudo, e disse à que estava agora feia e que cuidava que era a sua filha, que se preparasse e que fosse falar à noite com o príncipe, mas que não descobrisse a cara. Ela foi, e a primeira coisa que disse ao príncipe foi que estava enganado, que ela era muito feia. O príncipe dizia-lhe que não, e a pequena descobriu então a cara, mas a fada deu-lhe naquele mesmo instante a sua formusura.

O príncipe ficou mais apaixonado e disse que queria casar com ela; a pequena foi-o dizer à que pensava que ela era a sua filha. Fez-se o arranjo da boda, e chegou o dia em que vieram buscá-la para se ir casar; ela foi com a cara coberta com um véu, e a irmã, que estava agora bonita, ficou fechada na loja às escuras.

Assim que a menina deu a mão ao príncipe e ficaram casados, a fada deu-lhe a sua formusura, e foi então que a madrasta conheceu que aquela era a sua enteada e não a sua filha. Corre à pressa a casa, vai à loja da palha ver a pequena que lá fechara, e dá com a sua própria filha, que desde a hora do casamento da irmã tornara a ficar com a cara feia.

Ficaram ambas desesperadas e não sei como não arrebentaram de inveja. É bem certo o ditado: «Madrasta nem de pasta».

 

Contos Tradicionais do Povo Português - Teófilo Braga

 

 

quinta-feira, 30 de julho de 2015

A Primitiva Infâmia

 
 
 
 
 
 
 

Raúl Brandão (Foz do Douro, Porto, Portugal, 1867 – Lisboa, Portugal, 1930).
Foi escritor e jornalista.


Palavras de Raúl Brandão:
 
O respeito pelos pais só resiste enquanto os pais respeitem o interesse dos filhos.”



A Primitiva Infâmia


Desde que se cumpram certas cerimónias ou se respeitem certas fórmulas, consegue-se ser ladrão e escrupulosamente honesto - tudo ao mesmo tempo.
 
A honradez deste homem assenta sobre uma primitiva infâmia. O interesse e a religião, a ganância e o escrúpulo, a honra e o interesse, podem viver na mesma casa, separados por tabiques.
 
Agora é a vez da honra - agora é a vez do dinheiro - agora é a vez da religião.
 
Tudo se acomoda, outras coisas heterogéneas se acomodam ainda.
Com um bocado de jeito arranja-se-lhes sempre lugar nas almas bem formadas.
 
 
Raul Brandão, in "Húmus"
Imagem: pintura de Joseph Wright (Reino Unido, 1734 - 1797)

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Estado e Cultura

 
 




Sophia de Mello Breyner Andresen (Porto, Portugal, 1919 – Lisboa, Portugal, 2004).
É uma das mais importantes poetisas do século XX. 
Foi a primeira mulher portuguesa a receber o “Prémio Camões”.



Palavras de Sophia de Mello Breyner Andresen:
"A cultura é cara, a incultura é mais cara ainda".


Estado e Cultura


A cultura é uma das formas de libertação do homem. Por isso, perante a política, a cultura deve sempre ter a possibilidade de funcionar como antipoder.
E se é evidente que o Estado deve à cultura o apoio que deve à identidade de um povo, esse apoio deve ser equacionado de forma a defender a autonomia e a liberdade da cultura para que nunca a acção do Estado se transforme em dirigismo.


Sophia de Mello Breyner Andresen, in “Assembleia Constituinte, Agosto de 1975”.
Imagem: pintura de Júlio Pomar (Lisboa, Portugal, 1926).

terça-feira, 28 de julho de 2015

Corsino Fortes - Pecado Original

 
 
 
 
 
 

Corsino Fortes (Mindelo, São Vicente, Cabo Verde, 14 de Fevereiro de 1933 – 24 de Julho de 2015).
Escritor, poeta e político foi Presidente da Associação dos Escritores de Cabo Verde, o primeiro presidente da Academia Cabo-Verdiana de Letras e o primeiro embaixador do seu País em lisboa.

 
 
Palavras de Corsino Fortes:

Já não somos os flagelados do vento leste, pois o vento tornara-se metáfora anunciadora de mudanças sociais, signo cabo-verdiano de desafio”.

 
 
Pecado Original

 
Passo pelos dias
E deixo-os negros
Mais negros
Do que a noute brumosa.

Olho para as coisas
E torno-as velhas
Tão velhas
A cair de carunchos.

Só charcos imundos
Atestam no solo
As pegadas do meu pisar
E fica sempre rubro vermelho
Todo o rio por onde me lavo.

E não poder fugir
Não poder fugir nunca
A este destino
De dinamitar rochas
Dentro do peito...

 
Corsino Fortes


segunda-feira, 27 de julho de 2015

Lua Cheia

 
 
 
 
 
 
 
Matilde Rosa Araújo (Lisboa, Portugal, 1921-2010).

Foi professora, pedagoga, escritora e poetisa.

Considerava importante a literatura infanto-juvenil na formação das crianças, dedicando muito da sua vida à defesa dos seus direitos.

 
Palavras de Matilde Rosa Araújo:

 
“Nasci numa quinta em Benfica, no meio de árvores, flores, fontes, animais natureza viva que me seduzia. Perto de Jardim Zoológico. De noite, ouvia o ressonar ou o gemer dorido dos leões, dos tigres, do elefante e de outros animais que não identifico: eram "vozes" de animais presos. Vozes de grades. E gritos de aves estranhas. Ficava acordada para os ouvir, não sei porquê. E doíam-me. Não seria já o "gosto amargo" de sofrer (que não tenho) mas a inconsciente busca de um mundo próximo e livre que não entendia.”


 
Lua Cheia

 

Mãe, a Lua está tão cheia!
Tão cheia!
Não se vai entornar?
A mãe abraçou o filho
Com seus braços de Lua Nova
Com seu coração de Quarto Crescente
E contou-lhe devagarinho
A história do Quarto Minguante.


Matilde Rosa Araújo
Imagem: pintura de Alexander Jansson


domingo, 26 de julho de 2015

O Outro

 
 
 
 

Thomas Hardy (Reino Unido, 1840 – 1928).

Foi poeta e novelista.

 

Palavras de Thomas Hardy­:

“É magnífico ouvir o silêncio daquele homem.”

 

 
        O Outro

 

Eis aqui o chão antigo,
tão gasto e liso de andado.
Eis aqui limiar amigo
que mortos pés hão cruzado

Na cadeira ela sentada
para o lume se sorria;
e dele a vida brincada
no fogo se consumia.

Criança, em sonhos dancei;
feliz o dia passou,
dourado brasão de um rei.
Mas nenhum de nós olhou.

 

Thomas Hardy
Imagem: pintura de Kyffin Williams (Reino Unido, 1918 – 2006).


 

sábado, 25 de julho de 2015

Cartilha Maternal

 
 
 
 

João de Deus (Bartolomeu de Messines, Algarve, Portugal, 1830 – Lisboa, Portugal, 1896).

Foi poeta e pedagogo.

 

Cartilha Maternal
 
 
A Cartilha Maternal foi publicada, em 1877, pelo Abade D´Arcozelo, amigo pessoal de João de Deus.

A sua criação, em 1876, sugere um ensino fundamentado na língua viva, apresentando um abecedário, que deve ser ensinado por partes, destinado a ajudar a aprendizagem da leitura pelas crianças.

A Cartilha Maternal está dividida em vinte e cinco lições.

 
Sobre o método, disse o seu criador, o poeta João de Deus:

Seis meses, um ano e mais vozes sem sentido, bastam para imprimir no espírito o idiotismo. Por que razão observamos nós, a cada passo nos filhos da indigência, meramente abandonados à escola da vida, uma irradiação moral, uma viveza rara nos mártires do ensino primário? Às mães, que do coração professam a religião da adorável inocência e até por instinto sabem que em cérebros tão tenros e mimosos todo o cansaço e violência pode deixar vestígios indeléveis, oferecemos, neste sistema profundamente prático o meio de evitar a seus filhos o flagelo da cartilha tradicional.”

 
Em 1882, por decisão parlamentar, foi decretado o uso generalizado da Cartilha Maternal nas escolas portuguesas.

Quando foi publicada, mais de 80% dos portugueses não sabia ler nem escrever.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

PRÉMIO CAMÕES – 2011 – Manuel António Pina

 
 
 
 
 
 

Manuel António Pina (Sabugal, Portugal, 1943 – Porto, Portugal, 2012).

Poeta, jornalista, dramaturgo, cronista e autor de livros para crianças foi galardoado com o “Prémio Camões 2011”.

Instituído pelos governos português e brasileiro em 1988, o Prémio Camões distingue, anualmente, um autor que, pelo conjunto da sua obra, tenha contribuído para o enriquecimento do património literário e cultural da língua portuguesa.

O júri justificou a distinção pela “inventividade e originalidade  da obra” e “pelos trabalhos do autor noutras áreas da literatura, incluindo os seus textos como cronista, dramaturgo e romancista”.

Algumas das suas obras: Nenhum Sítio, Nenhuma Palavra e Nenhuma Lembrança, O País das Pessoas de Pernas para o Ar, O Anacronista, O Livro de Desmatemática e A Noite, Poesia Reunida.

 
Palavras de Manuel António Pina:

“A pobreza mete-nos medo. E, no entanto, alimentamo-nos da pobreza, é o seu sangue que move os nossos carros topo de gama e as nossas fábricas e é à sua sombra que florescem os nossos paraísos de consumo.”

 

 A um Homem do Passado

 

Estes são os tempos futuros que temia
o teu coração que mirrou sob pedras,
que podes recear agora tão fundo,
onde não chegam as aflições nem as palavras duras?

Desceste em andamento; afinal era
tudo tão inevitável como o resto.
Viraste-te para o outro lado e sumiram-se
da tua vista os bons e os maus momentos.

Tu ainda tinhas essa porta à mão.
(Aposto que a passaste com uma vénia desdenhosa.)
Agora já não é possível morrer ou,
pelo menos, já não chega fechar os olhos.

 

Manuel António Pina, in "Nenhum Sítio"

 


quarta-feira, 22 de julho de 2015

Este Não-Futuro que a Gente Vive

 
 
 
 
 

Al Berto (Coimbra, Portugal, 1948 – Lisboa, Portugal, 1997).

Poeta, pintor e editor.

 

 Este Não-Futuro que a Gente Vive

 

Será que nos resta muito depois disto tudo, destes dias assim, deste não-futuro que a gente vive? (...) Bom, tudo seria mais fácil se eu tivesse um curso, um motorista a conduzir o meu carro, e usasse gravatas sempre. Às vezes uso, mas é diferente usar uma gravata no pescoço e usá-la na cabeça.
Tudo aconteceu a partir do momento em que eu perdi a noção dos valores. Todos os valores se me gastaram, mesmo à minha frente. O dinheiro gasta-se, o corpo gasta-se. A memória. (...)
Não me atrai ser banqueiro, ter dinheiro. Há pessoas diferentes. Atrai-me o outro lado da vida, o outro lado do mar, alguma coisa perfeita, um dia que tenha uma manhã com muito orvalho, restos de geada…
De resto, não tenho grandes projectos. Acho que o planeta está perdido e que, provavelmente, a hipótese de António José Saraiva está certa: é melhor que isto se estrague mais um bocadinho, para ver se as pessoas têm mais tempo para olhar para os outros.

 

Al Berto, in "Entrevista à revista Ler "

Imagem: pintura de John Randall Bratby (Inglaterra, 1928 – 1992).

 

terça-feira, 21 de julho de 2015

MULHERES PIONEIRAS - Amélia Cardia

 
 
 
 
 

Amélia Cardia (Lisboa, Portugal, 1855 – 1938).

Foi médica, escritora e espírita. Estudou os clássicos e dedicou-se à crítica filosófica.

Foi uma das primeiras cinco médicas portuguesas e a primeira mulher a trabalhar num internato hospitalar.

Visitou os mais famosos hospitais europeus, adquirindo conhecimento dos mais recentes avanços da medicina.

Cooperou com a “Liga Nacional Contra a Tuberculose” e a “Associação das Ciências Médicas”, batendo-se pelo mais fácil acesso das mulheres à Medicina.

Fundou, em 1908, uma Casa de Saúde, na Estrela, que dirigiu durante oito anos, findos os quais decidiu abandonar a actividade médica, para se dedicar à literatura e aos estudos espíritas e filosóficos. Foi membro da “Federação Espírita Portuguesa”.

Algumas das suas obras: Febre Histérica, O Contágio da Tuberculose, Na Atmosfera da Terra, A Pecadora, Episódios de Guerra.

 

 

 

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Nau Catrineta

 
 
 
 
 
 
Almeida Garrett (Porto, Portugal, 1799 – Lisboa, Portugal, 1854).

Foi poeta, dramaturgo e orador parlamentar.

 

 
Palavras de Almeida Garrett:

“Bem nasce em todos os climas a semente da liberdade; mas desde que lhe germinam as folhas seminais, há-de haver um Washington que a monde, e ampare, ou os espinhos são tantos logo, tantos os cardos e abrolhos, que a afogam.”
 

Nau Catrineta

Lá vem a Nau Catrineta
Que tem muito que contar!
Ouvide agora, senhores,
Uma história de pasmar.

Passava mais de ano e dia
Que iam na volta do mar,
Já não tinham que comer,
Já não tinham que manjar.

Deitaram sola de molho
Para o outro dia jantar;
Mas a sola era tão rija,
Que a não puderam tragar.

Deitaram sortes à ventura
Qual se havia de matar;
Logo foi cair a sorte
No capitão general.

-“Sobe, sobe, marujinho,
Àquele mastro real,
Vê se vês terras de Espanha,
As praias de Portugal!”

- “Não vejo terras de Espanha,
Nem praias de Portugal;
Vejo sete espadas nuas Que estão para te matar.”

- “Acima, acima, gageiro,
Acima ao tope real!
Olha se enxergas Espanha,
Areias de Portugal!”

- “Alvíssaras, capitão,
Meu capitão general!
Já vejo terras de Espanha,
Areias de Portugal!”
Mais enxergo três meninas,
Debaixo de um laranjal:
Uma sentada a coser,
Outra na roca a fiar,
A mais formosa de todas
Está no meio a chorar.”

- “Todas três são minhas filhas,
Oh! quem mas dera abraçar!
A mais formosa de todas
Contigo a hei-de casar.”

- “A vossa filha não quero,
Que vos custou a criar.”

- “Dar-te-ei tanto dinheiro
Que o não possas contar.”

- “Não quero o vosso dinheiro
Pois vos custou a ganhar.”

- “Dou-te o meu cavalo branco,
Que nunca houve outro igual.”

- “Guardai o vosso cavalo,
Que vos custou a ensinar.”

- “Dar-te-ei a Catrineta,
Para nela navegar.”

- “Não quero a Nau Catrineta,
Que a não sei governar.”

- “Que queres tu, meu gageiro,
Que alvíssaras te hei-de dar?”

- “Capitão, quero a tua alma,
Para comigo a levar!”

- “Renego de ti, demónio,
Que me estavas a tentar!
A minha alma é só de Deus;
O corpo dou eu ao mar.”

Tomou-o um anjo nos braços,
Não no deixou afogar.
Deu um estouro o demónio,
Acalmaram vento e mar;

E à noite a Nau Catrineta
Estava em terra a varar.



Almeida Garrett, in “Romanceiro”

domingo, 19 de julho de 2015

O Porto é Só...

 
 
 
 
 
 
 
Eugénio de Andrade (Fundão, Portugal, 1923 – Porto, Portugal, 2005).
Foi poeta, escritor e tradutor.

 

 
Palavras de Eugénio de Andrade:

"A independência tem um preço, sempre o soube, e nunca me recusei a pagá-lo.”

 

 
O Porto é Só...

 

O Porto é só uma certa maneira de me refugiar na tarde, forrar-me de silêncio e procurar trazer à tona algumas palavras, sem outro fito que não seja o de opor ao corpo espesso destes muros a insurreição do olhar.

 O Porto é só esta atenção empenhada em escutar os passos dos velhos, que a certas horas atravessam a rua para passarem os dias no café em frente, os olhos vazios, as lágrimas todas das crianças de S. Victor correndo nos sulcos da sua melancolia.

 O Porto é só a pequena praça onde há tantos anos aprendo metodicamente a ser árvore, procurando assim parecer-me cada vez mais com a terra obscura do meu próprio rosto.

 Desentendido da cidade, olho na palma da mão os resíduos da juventude, e dessa paixão sem regra deixarei que uma pétala poise aqui, por ser tão branca.

 

Eugénio de Andrade, in “Poesia e Prosa”

 

 

sábado, 18 de julho de 2015

A Canção da Fome

 
 
 
 
 
 

Georg Weerth (Detmold, Alemanha, 1822 -Havana, Cuba, 1856).
Foi escritor e jornalista.

 

A Canção da Fome

 
Prezado senhor e rei,
Sabes a notícia grada?
Segunda comemos pouco,
Terça não comemos nada.
Quarta sofremos miséria,
E quinta passámos fome;
Na sexta quase nos fomos –
Não se aguenta quem não come!
Por isso vê se no sábado
Mandas cozer o pãozinho,
Senão no domingo, ó rei,
Vamos comer-te inteirinho!

 
 
Georg Weerth, in "Rosa do Mundo"
Tradução: João Barrento

 

sexta-feira, 17 de julho de 2015

CANCIONEIRO POPULAR - As Aves

 
 
 
 
 
 
 

As Aves

 

 
Bem pudera o senhor cuco

Casar com a cotovia,

Mas não quer o senhor cuco

Mulher que tanto assobia.

 

Ó que lindo bando

De pombos bravos

Comem a boleta

Por esses montados!

 

Apanhando os tiros

Dos caçadores,

Comem a boleta

Aos lavradores.

 

O rouxinol, quando bebe,

Bate as asas no corrente

Com o seu biquinho escreve

Cartas de um amor ausente.

 

O rouxinol, quando canta,

Canta bem pelo seguro

Canta três vezes no ano,

Em Abril e Maio e Junho.

 
Cancioneiro Popular Português de J. Leite de Vasconcellos