quarta-feira, 7 de maio de 2014

Um Morto Alegre

 
 
 

 
 
Um Morto Alegre

 

 

Numa terra sem vida, abandonada e dura,

 quero eu mesmo cavar um buraco profundo,

 onde possa esticar minha velha ossatura

 para dormir tranqüilo, esquecido do mundo.

 

Odeio o testamento, odeio a sepultura;

 a esmolar compaixão como um vil vagabundo,

 antes quisera ver minha carcaça impura, 

inda viva servir de pasto a um corvo imundo.

 

Vermes, amigos meus sem olhos, sem ouvidos,

 um morto vos procura alegre e descuidado! 

Filhos da podridão, asquerosos e tortos.

 

Sem pena percorrei meus restos corrompidos,

 e dizei-me se pode inda ser torturado

 este corpo sem alma e mais morto que os mortos!

 

 

 

Charles Beaudelaire

 
Tradução: Paulo César Pimentel

Ilustração: pintura rupestre com 14.000 anos localizada na região de Acacus, maciço rochoso no oeste da Líbia, no deserto do Saara. Esta área está inscrita na UNESCO, desde 1985, como Património Mundial, devido à importância das pinturas rupestres.

 

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