sábado, 8 de novembro de 2014

Prémio Camões - 2005

 
 
 
 
 
 
 

Lygia Fagundes Telles (São Paulo, Brasil, 1923).

Em 2005, um júri constituído pelos escritores portugueses Agustina Bessa-Luís e Vasco Graça Moura, pelo cabo-verdiano Germano de Almeida, pelos brasileiros António Carlos Secchin e Ivan Junqueira e pelo angolano José Eduardo Agualusa elegeu Lygia Fagundes Telles como a vencedora do Prémio Camões 2005.

Este prémio é o mais importante da literatura em língua portuguesa.

Recebeu o prémio em Outubro de 2005, no Porto, Portugal, na cerimónia de encerramento da VIII Cúpula Luso-Brasileira.

Algumas das suas obras de sucesso: Ciranda de Pedra, Verão no Aquário, As Meninas, As horas Nuas, Seminário de ratos, Filhos pródigos e Mistérios.                

 

 
Palavras de Lygia Fagundes Telles:

“Não separe com tanta precisão os heróis dos vilões, cada qual de um lado, tudo muito bonitinho como nas experiências de química. Não há gente completamente boa nem gente completamente má, está tudo misturado e a separação é impossível. O mal está no próprio gênero humano, ninguém presta.”


Excerto do texto extraído dos Cadernos de Literatura Brasileira:
 
 História de passarinho
 
Um ano depois os moradores do bairro ainda se lembravam do homem de cabelo ruivo que enlouqueceu e sumiu de casa. Ele era um santo, disse a mulher abrindo os braços. E as pessoas em redor não perguntaram nada e nem era preciso, perguntar o que se todos já sabiam que era um bom homem que de repente abandonou casa, emprego no cartório, o filho único, tudo.
 
E se mandou Deus sabe para onde. Só pode ter enlouquecido, sussurrou a mulher, e as pessoas tinham que se aproximar inclinando a cabeça para ouvir melhor. Mas de uma coisa estou certa, tudo começou com aquele passarinho, começou com o passarinho.
 
Que o homem ruivo não sabia se era um canário ou um pintassilgo.
 
Ô, Pai! caçoava o filho, que raio de passarinho é esse que você foi arrumar?!
 
O homem ruivo introduzia o dedo entre as grades da gaiola e ficava acariciando a cabeça do passarinho que por essa época era um filhote todo arrepiado, escassa a plumangem de um amarelo-pálido com algumas peninhas de um cinza-claro.
 
Não sei, filho, deve ter caído de algum ninho, peguei ele na rua, não sei que passarinho é esse. O menino mascava chicle. Você não sabe nada mesmo, Pai, nem marca de carro, nem marca de cigarro, nem marca de passarinho, você não sabe nada.(…)
 
Lygia Fagundes Telles
 






 

1 comentário:

  1. O final, não publicado, é o mais forte nesse conto. Gosto de lê-lo com os alunos, pois nos faz refletir sobre o modo como banalizamos as relações com as pessoas mais próximas e como, por vezes, elas se tornam invisíveis para nós!

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