segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Que quer dizer a mágoa sempre que se deixa

 
 
 
 
 
 
 

Que quer dizer a mágoa sempre que se deixa

 

 Que quer dizer a mágoa sempre que se deixa
 fazer sentir, quando se afasta depois
 de ocupar os únicos sítios? O que quero
 dizer fica menos veloz. A evitar o azul branco
 do céu sobre mim, a visitar esta terra só
 de inverno. Seria inútil começar agora
 uma conversa mais explícita, talvez
 sobre o ritmo exigente da cidade em que estás
 ou sobre a actividade quase perfeita das crianças
 em redor. Prefiro calar-me, sentir o vento
 que vem do mar, rir um pouco tropeçando
 na madeira corroída.
 De pouco serve escutar assim as vozes
 já tão cansadas, antes a cuidadosa escolha
 das tábuas a pôr na casa vazia. Depois
 falaste-me de um eco, de um barco inclinando-se,
 da casa que não tens.
 Esgota-se o que mais falta. Que vamos
 dizer? Está bem amo-te. E ao fogo
 acabando na cinza, à manhã que não existe.
 
Hélder Moura Pereira (Setúbal, Portugal, 1949)
 
 

 

 

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