quarta-feira, 16 de setembro de 2015

VICTOR JARA - Estádio Chile

 
 
 
 
 
Victor Jara (San Ignacio, Chile, 1932 – Santiago, Chile, 1973).
 
Poeta, director de teatro, dramaturgo, compositor, músico, cantor e professor universitário foi, provavelmente, a figura mais reconhecida na história da música popular latino-americana.
 
Após o golpe de 73, foi preso e torturado no “Estádio Chile”. Foi baleado, pelos militares, 44 vezes.
 
Escreveu, ao ser detido, o seu último poema, Estádio Chile, no qual descrevia o ambiente à sua volta.
 
 
 Palavras de Victor Jara:
“Não acredito em nada a não ser no calor da tua mão na minha mão.”
 
 
Estádio Chile
 
 
Somos cinco mil
nesta pequena parte da cidade.
Somos cinco mil.
Quantos seremos no total,
nas cidades e em todo o país?
Somente aqui, dez mil mãos que semeiam
e fazem andar as fábricas.
 
Quanta humanidade
com fome, frio, pânico, dor,
pressão moral, terror e loucura!
 
Seis de nós se perderam
no espaço das estrelas.
 
Um morto, um espancado como jamais imaginei
que se pudesse espancar um ser humano.
 
Os outros quatro quiseram livrar-se de todos os temores
um saltando no vazio,
outro batendo a cabeça contra o muro,
mas todos com o olhar fixo da morte.
 
Que espanto causa o rosto do fascismo!
 
Colocam em prática seus planos com precisão arteira,
sem que nada lhes importe.
 
O sangue, para eles, são medalhas.
 
A matança é acto de heroísmo.
 
É este o mundo que criaste, meu Deus?
Para isto os teus sete dias de assombro e trabalho?
 
Nestas quatro muralhas só existe um número
que não cresce,
que lentamente quererá mais morte.
 
Mas prontamente me golpeia a consciência
e vejo esta maré sem pulsar,
mas com o pulsar das máquinas
e os militares mostrando seu rosto de parteira,
cheio de doçura.
 
E o México, Cuba e o mundo?
 
Que gritem esta ignomínia!
Somos dez mil mãos a menos
que não produzem.
 
Quantos somos em toda a pátria?
 
O sangue do companheiro Presidente
golpeia mais forte que bombas e metralhas.
 
Assim golpeará nosso punho novamente.
 
Como me sai mal o canto
quando tenho que cantar o espanto!
 
Espanto como o que vivo
como o que morro, espanto.
 
De ver-me entre tantos e tantos
momentos do infinito
em que o silêncio e o grito
são as metas deste canto.
 
O que vejo nunca vi,
o que tenho sentido e o que sinto
fará brotar o momento...
 
 
Victor Jara
Imagem: mural em Santiago do Chile

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