segunda-feira, 9 de novembro de 2015

PIER PAOLO PASOLINI – A Recessão - (Poema profético)

 
 
 
 
 
 

Pier Paolo Pasolini (Bolonha, Itália, 1922 – Óstia, Itália, 1975)

 
Foi poeta, dramaturgo, realizador de cinema e romancista.
Estudou arte e literatura na Universidade de Bolonha.

Em Roma, durante a década de 1950, conviveu com o submundo da cidade, que lhe  forneceu  matéria para escrever os seus dois primeiros romances, Ragazzi di Vita e Una Vita Violenta.

Muitos críticos, como Alberto Moravia, considerou-o um dos poetas contemporâneos mais importantes da Itália, que deu voz à geração pós-guerra.

Na manhã de 1 de novembro de 1975, Pasolini foi brutalmente assassinado. O seu corpo foi descoberto em terreno baldio próximo à estância balnear de Óstia.

 
 
Palavras de Pier Paolo Pasolini:

Pecar não é praticar o mal. O verdadeiro pecado é não fazer o bem.”

 
 
A Recessão (Poema profético)

 
Reveremos calças com remendos

vermelhos pores do sol sobre as aldeias

vazias de carros

cheias de pobre gente que terá voltado de Turim ou da Alemanha.

Os velhos serão donos de suas muretas como poltronas de senadores

e as crianças saberão que a sopa é pouca e o que significa um pedaço de pão.

E a noite será mais negra que o fim do mundo e de noite ouviremos os grilos ou os trovões

e talvez algum jovem entre aqueles poucos que voltaram ao ninho tirará pra fora um bandolim.

O ar terá o sabor de trapos molhados

tudo estará longe

trens e ônibus passarão de vez em quando como num sonho.

E cidades grandes como mundos estarão cheias de gente que vai a pé

com as roupas cinzas

e dentro dos olhos uma pergunta que não é de dinheiro mas é só de amor

somente de amor

As pequenas fábricas no mais belo de um prado verde

na curva de um rio

no coração de um velho bosque de carvalhos

desabarão um pouco por noite

Mureta por mureta

Teto em chapa por teto em chapa

E as antigas construções

serão como montanhas de pedra

sós e fechadas como eram uma vez.

E a noite será mais negra que o fim do mundo

e de noite ouviremos os grilos e os trovões

O ar terá o sabor de trapos molhados

tudo estará longe

trens e ônibus passarão

de vez em quando como num sonho

E os bandidos terão a face de uma vez

Com os cabelos curtos no pescoço

e os olhos de suas mães cheios do negro das noites de lua

e estarão armados só de uma faca

O tamanco do cavalo tocará a terra leve como uma borboleta

e lembrará aquilo que foi o silêncio o mundo

e aquilo que será.

 

Pier Paolo Pasolini

Tradução: Mario S. Mieli

Imagem: pintura de Nelson Gonzalez (Santo Domingo, República Dominicana, 1972).

 

 

 

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