quarta-feira, 12 de outubro de 2016

RUY CINATTI – Memória Amada



Ruy Cinatti (Londres, Inglaterra, 1915 - Lisboa, Portugal, 1986).

O poeta e silvicultor Ruy Cinatti chegou, pela primeira vez, a Timor no mês de Julho de 1946. Tinha acabado de ser nomeado secretário do governador Óscar Ruas, quatro anos após a violenta invasão japonesa. 

Os tempos eram de reconstrução e nos primeiros tempos ficou confinado a serviços de secretaria. Até que o governador, nos últimos meses de 1947 o autoriza a percorrer livremente Timor, orientado por autóctones, a fim de elaborar um levantamento fito-geográfico que integraria a sua tese de licenciatura.

De 1948 a 1951, Cinatti encontra-se em Lisboa. A sua tese é aprovada com 19 valores e ele regressa a Timor, esta vez como chefe dos Serviços de Agricultura. Entretanto, aprofunda-se nele o afecto pelos timorenses. Cada vez mais se convence que um desenvolvimento agrícola sustentável de Timor será possível só numa articulação íntima com a cultura local e o respeito pela conservação das florestas.

Em 1956, de regresso a Lisboa, Cinatti publica um manifesto "Em favor do Timorense" e dois anos mais tarde entrega às autoridades um "Plano de Fomento Agrário para Timor". Entretanto fixa-se em Oxford, onde prepara um tese de doutoramento. 

Em 1961 regressa a Timor para recolher elemento para a tese e anota, chocado, a delapidação em curso do património cultural do território. Datam dessa visita 6.000 metros de filme. A última viagem decorreu em 1966.

Em Janeiro de 1975 dirigiu uma longa carta ao Diário de Notícias, prevenindo o país do perigo que Timor corria, mas a carta nunca foi publicada e a invasão indonésia foi para ele um rude golpe.




Fonte: Instituto Camões – O Timor de Ruy Cinatti - autoria de Peter Stilwell, actual Reitor da Universidade de S.José, Macau.
                  

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     Memória Amada
   (Para Alain Fournier)


Vinham de longe em bandos. Acorriam
Jubilosos. Fantasias
De parques pluviosos
E, descendo,
Os patos bravos lançados
Entre juncos, salgueiros e veados.
Tarde,
Muito tarde, uns olhos tais
Haviam de aparecer, sobressaltados
Entre enigmas e um floco de cabelos
Osculado pelo vento. Alegorias...
Do agora ou nunca e do momento
Definido. Trégua impensada,
Insuspeita, no perfume alado
Da página dobrada e abandonada
Dum livro interrompido. Sinto a dor fina,
Finamente atravessada e suave,
- Quase saudade.




in "O Livro do Nómada Meu Amigo"



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