quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

SEBASTIÃO DA GAMA - Largo do Espírito Santo, 2-2º




SEBASTIÃO DA GAMA
(Azeitão, Setúbal, Portugal, 1924 – Lisboa, 1952)

Poeta e pedagogo


LARGO DO ESPÍRITO SANTO, 2-2º

Nem mais, nem menos: tudo tal e qual
o sonho desmedido que mantinhas.
Só não sonharas estas andorinhas
que temos no beiral.

E moramos num largo… E o nome lindo
que o nosso largo tem!
Com isto não contáramos também
(Éramos dois sonhando e exigindo.).

Da nossa casa o Alentejo é verde.
É atirar os olhos: são searas,
são olivais, são hortas... E pensaras   
que haviam nossos olhos de ter sede!

E o pão da nossa mesa!... E o pucarinho
que nos dá de beber!... E os mil desenhos
da nossa loiça: flores, peixes castanhos,
dois pássaros cantando sobre um ninho…

E o nosso quarto?... Agora podes dar-me
teu corpo sem receio ou amargura.
Olha como a Senhora da moldura
sorri à nossa alma e à nossa carne!

Em tudo, ó Companheira,
a nossa casa é bem a nossa casa.
Até nas flores. Até no azinho em brasa
que geme na lareira.

Deus quis. E nós ao Sonho erguemos muros,
rasguei janelas eu e tu bordaste
as cortinas. Depois, ó flor na haste,
foi colher-te e ficarmos ambos puros.

Puros, Amor - e à espera.
E serenos. Também a nossa casa
(Há-de bater-lhe à porta, com a asa,
um anjo de sangue e carne verdadeira).


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