terça-feira, 17 de julho de 2018

BEATRIZ COSTA – Três gigantes



BEATRIZ COSTA
(Charneca do Milharado, Portugal, 1907 - Lisboa, 1996)
Actriz de teatro e cinema

***
Três gigantes

1973 ceifou dois homens que marcaram na minha vida: Pablo Picasso e Pablo Casals

Pablo Neruda também foi nesse mesmo ano e a sua morte foi uma grande tragédia. Ainda insepulto, saquearam-lhe a casa e roubaram recordações duma vida fabulosa! Quadros valiosíssimos, esculturas, tapetes e peças raras de artesanato do mundo inteiro, que o grande poeta conhecia e admirava, porque era um viajante incansável. 

Neruda lia muito sobre Portugal, que conhecia mal e desejava visitar… Quem teria levado aquele lindo galo de Barcelos, que ele dizia ser umas das suas peças mais queridas? Aquele galo antigo, que, graças a um amigo do Norte, consegui e levei comigo para Paris, quando o grande poeta era embaixador do Chile. 

Pablo Neruda, Prémio Nobel da Literatura, merecia mais respeito da sua gente, porque o Prémio Nobel não é dado a qualquer «sujeitinho».

Pablo Picasso, por quem «tive a honra» de ser apalpada em casa de Madame Skiaparelli, esse génio malaguenho, que se fartou de gozar com a malta «indinheirada», deixou mais de um bilhão de dólares, a maior fortuna que um artista já acumulou. 

Adorava apalpar a mulher dos outros, mas ai de quem apalpasse a sua… Um dia passou por uma pequena e graciosa aldeia encarrapitada na Côte d´Azur, que tinha sido famosa pelas olarias que lá existiram. No momento da visita do génio andaluz, tudo parecia adormecido. Os velhos oleiros já não tinham forças nem imaginação e os jovens queriam era Paris, porque «lá é que é bom!...» Picasso resolveu espevitar aquela gente de aparência desanimada e instalou-se lá. Apaixonou-se pelo barro e num abrir e fechar de olhos criou peças que hoje valem o que os donos quiserem pedir por elas…

Pablo Casals, quando quis casar comigo, já tinha bastante idade. O casamento com mulher jovem era uma ideia fixa. Acabou por dar o seu nome ilustre a uma discípula de vinte e um anos, que foi sua viúva por pouco tempo, pois casou a seguir com o pianista do falecido marido…

Vinicius de Moraes, um dos homens mais sensacionais da minha época, fez um poema, que é uma jóia, de homenagem a esses três Pablos, que o mundo perdeu e de que não volta a conhecer outros…

                    Que no ano mais sem critério,
                    Esse de setenta e três,
                    Levou para o cemitério
                    Três Pablos de uma vez,
                    Três Pablões, não Pablitos,
                    No tempo, como no espaço;
                    Pablos de muitos caminhos:
                    Neruda, Casals, Picasso…



in “Quando os Vascos eram Santanas” - 1977



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