sexta-feira, 8 de maio de 2020

ALFREDO BROCHADO - Mãe



ALFREDO BROCHADO
(Amarante, Portugal, 1897 – Lisboa, 1949)
Poeta

***
Aquilino Ribeiro chamou-lhe o irmão franciscano de todos os escritores e artistas. E ainda hoje se torna difícil entender como, sendo ele um homem meigo e doce, de espírito generoso e afável, não teve piedade de si, ao socorrer-se do nó corredio de uma corda para pôr termo à vida por enforcamento. Os versos que nos deixou, quanto mais simples mais belos. Os seus cantos são como murmúrios, doce balir da inocência poética.


in “Dicionário da Língua Portuguesa”


***
MÃE

I

Dantes, quando a deixava,
As férias já no fim,
Ela vinha à janela
Despedir-se de mim.

Depois, quando na estrada,
Olhava para trás,
Deitava-me ainda a benção
Para que eu fosse em paz.

Dali não se movia,
À vidraça encostada,
Até que eu me perdia
Já na curva da estrada.

Hoje, se olho, calo-me
E baixo os olhos meus!
Já não vem à janela
Para dizer-me adeus!


II

Chove, e a chuva é fria.
Noite! Nos montes distantes
O Inverno principia.
Um Inverno como dantes.

Ao redor do lume aceso
Todos ficamos a olhar...
Todos não, não somos todos,
Porque há vazio um lugar.

Esse lugar era o dela,
Que ninguém mais preencheu.
Mesmo com vida, na terra,
Era uma estrela no céu.



in "Bosque Sagrado”

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