sexta-feira, 4 de setembro de 2015

PRÉMIO CAMÕES – 2013

 
 





Mia Couto (Beira, Moçambique, 1955).

É, actualmente, o autor moçambicano mais traduzido e divulgado no estrangeiro.
Tem uma obra literária extensa e diversificada, incluíndo poesia, contos, romance e crónicas.

Instituído pelos governos português e brasileiro em 1988, o “Prémio Camões” distingue, anualmente, um autor que, pelo conjunto da sua obra, tenha contribuído para o enriquecimento do património literário e cultural da língua portuguesa.

 

Palavras de Mia Couto:

“A nossa língua comum foi construída por laços antigos, tão antigos que por vezes lhes perdemos o rastro.”
 
     
         Saudade


Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
dói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
 


Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas

 

Seja eu de novo tua sombra, teu desejo
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta

 

Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono

 

Mia Couto, in “Raiz de Orvalho”

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