quinta-feira, 31 de março de 2016

OS VENCIDOS DA VIDA







Os Vencidos da Vida: Grupo literário de intelectuais que, entre 1887 e 1893, se reunia ora no Hotel Bragança ora no Café Tavares, em Lisboa, para jantar e discutir os problemas do País.

O grupo congregava os membros mais destacados da chamada “Geração de 70”, entre os quais Oliveira Martins, (autor da denominação do grupo).

Foi Carlos Lobo de Ávila, director do jornal “O Tempo”, quem propagou estes encontros que imprimiram ao grupo o diletantismo elegante que se repercutiu de forma hostil fora dos bastidores, sobretudo através de outros homens de letras, em que se incluíam Fialho de Almeida e Pinheiro Chagas.

Abel Botelho escreveu, inclusivamente, uma peça de teatro que tinha por título “Os Vencidos da Vida” (1892), que não foi levada à cena dado o seu carácter de violência satírica pessoal.

O grupo “Os Vencidos da Vida” foi um exemplo de convivência e tolerância recíproca num meio cultural dominado pela polémica



Comentário de Fialho de Almeida sobre o grupo “Os Vencidos da Vida”:
“Dúzia e meia de ratões que, quando juntos, o que pretendem é jantar; depois de jantar, o que intentam é digerir; e digestão finda, se alguma coisa ao longe miram, tanto pode ser um ideal, como um water-closet.”



Fonte: Literatura Portuguesa
Imagem: fotografia do grupo “Os Vencidos da Vida”:

Em pé: Conde de Sabugosa, Carlos de Lima Mayer, Carlos Lobo d´Ávila, Oliveiras Martins, Luís de Soveral, Guerra Junqueiro e Conde Arnoso.

Sentados: Ramalho Ortigão, Eça de Queirós, Conde de Ficalho e António Cândido. 


quarta-feira, 30 de março de 2016

ALICE GOMES - Na idade dos porquês





Alice Gomes (Granjinha, Tabuaço, Portugal, 1910 – Lisboa, Portugal, 1983).

Escritora, pedagoga, conferencista, dramaturga, Alice Gomes foi uma mulher de acção, que deixou publicados vários contos, poesias, traduções, ensaios e outros tantos por publicar.

De toda a sua experiência de convívio e estudo da criança resulta uma obra diversificada onde a formação de pedagoga se associa à imaginação e ao humor. É com subtileza que procura incutir princípios que dignificam o futuro das crianças e é também com alegria que os procura atrair para a leitura, de modo a que não percam o gosto e a necessidade de ler.

Em estilo dialogante e comunicativo conta histórias do real retocado pelo maravilhoso ou pelo sonho em o Vidrinho de Cheiro e Contos Risonhos, para logo em os Ratos e o Trovador enveredar pela teatralização da lenda do flautista de Hamlim. A Lenda das  AmendoeirasNau Catrineta são duas outras peças teatrais de Alice Gomes.

Poesia Para a infância (1955) é uma antologia de poesia portuguesa e brasileira. Outras das suas obras dedicadas à poesia são Poesia de infância (1966) e Bichinho poeta (1970), livro de poemas que ocupa um lugar destacado na obra desta escritora que foi elemento proeminente de várias actividades ligadas à criança. 

As reflexões que deixou expressas em Aprender sorrindoLiteratura para a Infância, 1979, demonstram a sua contínua actividade de escritora e divulgadora de literatura infantil.



Fonte: Biblioteca Nacional de Portugal




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Na idade dos porquês


Professor diz-me porquê?
Por que voa o papagaio
que solto no ar
que vejo voar
tão alto no vento
que o meu pensamento
não pode alcançar?

Professor diz-me porquê?
Por que roda o meu pião?
Ele não tem nenhuma roda
E roda gira rodopia
e cai morto no chão...

Tenho nove anos professor
e há tanto mistério à minha roda
que eu queria desvendar!
Por que é que o céu é azul?
Por que é que marulha o mar?
Porquê?
Tanto porquê que eu queria saber!
E tu que não me queres responder!

Tu falas falas professor
daquilo que te interessa
e que a mim não interessa.
Tu obrigas-me a ouvir
quando eu quero falar.
Obrigas-me a dizer
quando eu quero escutar.
Se eu vou a descobrir
Fazes-me decorar.

É a luta professor
a luta em vez de amor.

Eu sou uma criança.
Tu és mais alto
mais forte
mais poderoso.
E a minha lança
quebra-se de encontro à tua muralha.

Mas
enquanto a tua voz zangada ralha
tu sabes professor
eu fecho-me por dentro
faço uma cara resignada
e finjo
finjo que não penso em nada.

Mas penso.
Penso em como era engraçada
aquela rã
que esta manhã ouvi coaxar.
Que graça que tinha
aquela andorinha
que ontem à tarde vi passar!...

E quando tu depois vens definir
o que são conjunções
e preposições...
quando me fazes repetir
que os corações
têm duas aurículas e dois ventrículos
e tantas
tanta mais definições...

o meu coração
o meu coração que não sei como é feito
nem quero saber
cresce
cresce dentro do peito
a querer saltar cá para fora
professor
a ver se tu assim compreenderias
e me farias
mais belos os dias.



Imagem: fotografia de autoria do artista surrealista Fernando Lemos, datada do início da década de 50 do século XX.


terça-feira, 29 de março de 2016

SAUL BELLOW - A Libertação para a Individualidade






Saul Bellow (Montreal, Canadá, 1915 – Brookline, EUA, 2005)

Romancista, filho de judeus russos imigrantes, iniciou a sua carreira trabalhando na Enciclopédia Britânica e dando aulas na Universidade de Princeton.
Estudou antropologia e sociologia na Universidade de Northwestern.
Foi autor de livros de grande sucesso, como A Vítima (sobre o antissemitismo), As Aventuras de Augie March, Herzog, O Planeta de Mr. Sammler.

Recebeu, em 1976, o “Prémio Nobel de Literatura”.


Palavras de Saul Bellow:
“Estar preparado para responder a todas as perguntas é o sinal infalível da estupidez.”


A Libertação para a Individualidade


Esta libertação para a individualidade não foi um grande sucesso. Para um historiador, tem todo o interesse. Mas para alguém consciente do sofrimento, é pavoroso. Corações que não encontram verdadeira gratificação, almas sem alimento. Falsidades, ilimitadas. Desejos, ilimitados. Possibilidades, ilimitadas. Exigências impossíveis feitas a realidades complexas, ilimitadas. Regresso a formas de religiosidade grosseira e infantil, a mistérios, totalmente inconscientes, claro — espantoso. Orfismo, mitraísmo, maniqueísmo, gnosticismo.



Saul Bellow, in “O Planeta de Mr. Sammler” 


segunda-feira, 28 de março de 2016

GUILHERMINA SUGGIA – Violoncelista





Guilhermina Suggia (Porto, Portugal, 1885 – 1950)

Iniciou o estudo do violoncelo com seu pai e aos 13 anos já fazia parte do quarteto de música de câmara do Orfeon Portuense.

Em 1901, partiu para a Alemanha, onde prosseguiu a sua formação instrumental em Leipzig, com o violoncelista e professor Julius Klengel

Com 17 anos tocou, tocou na Gewandhaus de Leipzig, que era então a mais reputada sala de concertos da Alemanha. Foi o princípio de uma notável carreira internacional, que a levou a percorrer as principais capitais da Europa. 
Era especialmente conhecida e estimada na Grã- Bretanha e Londres tornou-se o centro da sua actividade artística. Foi, aliás, no quadro do Festival de Edimburgo, em 27 de Agosto de 1949, que tocou pela última vez em público.

Depois da I Guerra Mundial, fixou-se no Porto, onde formou numerosos violoncelistas portugueses.

Em 1944, o Governo português condecorou-a com o Grande Oficialato da Ordem de Cristo.



Fonte: Mulheres Célebres (resumo)

Imagem: retrato a óleo sobre tela, pintado por Augustus John (Reino Unido, 1878 – 1910). Este retrato de Guilhermina Suggia está na "Tate Gallery", em Londres. 

domingo, 27 de março de 2016

BARALHA DAS RUAS








Baralha das Ruas


          Mote


Houve uma grande baralha
Nas ruas da capital,
No fim d´esta zaragata
Foi o Camões p´ra o hospital.


                    I

A Rua d´Amendoeira
E o Largo d´Anunciada
Deram muita cacetada
Lá no Arco do Bandeira.
Veio a Praça da Figueira
Com uma enorme navalha,
Deu na Travessa da Palha
Uma facada profunda.
Avenida, na rotunda;
Houve uma grande baralha.
                     

                    II


Veio depois a Mouraria
A riscar com o Aterro,
O Rato atirou-lhe um berro
Como quem os desafia.
Grita a Praça d´Alegria
Contra o Príncipe Real;
Faz um banzé infernal
A Rua do Passadiço,
Houve um grande reboliço,
Nas ruas da capital.



                    III


Alfama muito taxada
Começa à pancada à Sé,
E a Rua de S.José
Atira-lhe uma lambada.
A Graça toda escamada
Espezinha a Rua da Prata,
E a Rua Augusta pacata,
Apesar de ser prudente,
Chama tolo ao Intendente
No fim d´esta zaragata.


                   IV


A Rua dos Cavaleiros
Fica ferida no combate;
E o Chiado, p´ra remate,
Mata a Rua dos Fanqueiros.
A Rua dos Retroseiros
Vai ter co´a Patriacal…
O barulho era geral,
E quando chegou ao fim
Foi o Carmo p´ra o estarim
E o Camões p´ra o hospital.                                         




Fonte: Histórias do Fado – revista Fado Moderno Nº1 – Boas Cantigas para Piano e Guitarra.

Imagem: Lisboa.

sábado, 26 de março de 2016

MIGUEL BOMBARDA – Médico e Escritor






Miguel Bombarda (Rio de Janeiro, Brasil, 1851 – Lisboa, Portugal, 1910).

Professor, médico e escritor foi ainda um dos precursores da primeira República.
Empenhou-se, sobretudo, na reforma do ensino, criação de laboratórios e na construção da nova “Escola Médico-Cirúrgica”.

Apaixonado pela psiquiatria, adquiriu uma reputação de sábio alienista que o tornou respeitável tanto no país como no estrangeiro. Foi ainda o principal fundador da “Liga Nacional contra a Tuberculose” e, através do seu prestígio, tornou possível a realização em Portugal (1906) do XV Congresso Internacional de Medicina.

Além da sua notável obra de modernização e humanização da assistência no Hospital de Rilhafoles, Miguel Bombarda, foi Presidente da “Sociedade de Ciências Médicas”, professor de Fisiologia e de Histologia, fundador e director, desde 1882, do semanário “Medicina Contemporânea”, autor de centenas de artigos científicos e de 20 livros.

É inquestionavelmente considerado pelos historiadores como o médico mais prestigiado pelos seus pares e o mais famoso entre a população, em Portugal, na sua época, inaugurando a figura do médico com forte visibilidade pública, social e política, que teve vários continuadores, em especial na primeira metade do século XX.

Estranhamente, ou talvez não, a incontornável figura de Miguel Bombarda tem sido lamentavelmente esquecida nos últimos anos, por alguns ditos historiadores e médicos, ao mesmo tempo que o “seu” Hospital era encerrado e se anunciava o propósito de destruir património e de construir no local diversos enormes edifícios …

Foi assassinado no seu gabinete do Hospital Rilhafoles, por um doente mental.

 


Fontes: “Dicionário Literatura Portuguesa” e “Arte Outsider, Arte de Doentes e Neurociências.” (excertos e adaptação).

Imagem: retrato a óleo sobre tela do Professor Miguel Bombarda, de 1911, da autoria de Veloso Salgado.


sexta-feira, 25 de março de 2016

FERNANDO CORREIA DIAS – Um Poeta do Traço






Fernando Correia Dias (Penajóia, Lamego, Portugal, 1892 – Rio de Janeiro, Brasil, 1935).

Ilustrador, pintor, caricaturista, capista, escultor, publicitário, designer (mesmo antes de existir esta denominação), Correia Dias foi um poeta do traço, com o qual abordou toda a expressão das artes gráficas como suprema expressão da alma.

Seu neto Alexandre Carlos Teixeira sentiu ser imprescindível o resgate da obra do artista luso-brasileiro Fernando Correia Dias, um homem à frente de seu tempo, que veio para o Brasil, influenciou decisivamente a vertente marajoara do Nativismo Art Déco, e aqui se envolveu com a elite cultural e conheceu a poetisa Cecilia Meireles, com quem se casou e teve três filhas. (…)

Uma significativa parte dos trabalhos criados por Fernando Correis Dias foi amealhada por Cecília Meireles no ateliê do artista, cuidadosamente guardada em caixas, e ficou sem ver a luz por 78 anos, numa paciente espera pela oportunidade de ressurgir das cinzas, algum dia.(…)

Anos após, examinando o material, Alexandre ficou admirado ao constatar a grande quantidade – e, principalmente, a alta qualidade - de sua produção artística, que havia sido cuidadosamente preservada por Cecília, por mais de meio século.(…)

Mais alguns anos se passaram e Alexandre teve a oportunidade de estabelecer contacto com um português estudioso da arte dos quadrinhos chamado Osvaldo Macedo de Sousa. Chamou sua atenção encontrar alguém que, de uma forma totalmente espontânea, conhecia bastante bem e interessava-se pela trajectória de vida e pela obra de seu avô, apesar das pouquíssimas informações sobre ele disponíveis. Um encontro dos dois, com a presença do editor Carlos Barbosa, permitiu que fosse então alinhavado o livro Fernando Correia Dias: Um Poeta do Traço.

Chegou finalmente ao conhecimento de todos a obra-prima que conta parte da história deste génio chamado Fernando Correia Dias. (…)
Para a publicação deste livro, foi feita uma criteriosa pesquisa em revistas e jornais do início do século passado à procura de trabalhos do artista, o escaneamento e limpeza digital do material em arquivo, a selecção das imagens ao longo de quase dois anos, além da preparação de um texto extremamente bem-cuidado e criterioso. 



Fonte: Clock 51 (excertos e adaptação)



quinta-feira, 24 de março de 2016

EDUARDO GUIMARÃES - Aos Lustres






Eduardo Guimarães (Porto Alegre, Brasil, 1892 – Rio de Janeiro, Brasil, 1928).

Integrou o grupo dos poetas simbolistas, formando com Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens, a “trilogia simbolista” no Brasil.
Os seus versos têm grande poder sugestivo e fazem dele um dos melhores poetas do seu tempo.
Algumas das suas obras: Caminho da Vida, A Divina Quimera.



Palavras de Eduardo Guimarães:
“Uma carta de amor fala me­lhor que um lábio.”




                   Aos Lustres


Suspensos nos salões dos tetos decorados,
Que de arabescos orna o gesso alvinitente,
Ó lustres de cristal, enganadoramente
Ao mesmo tempo sois sonoros e calados.

Pesados, emprestais, no entanto, à pompa ambiente,
Onde há ricos painéis entre florões doirados,
A mais aérea graça, e os olhos deslumbrados
Sentem que os cega o vosso encanto reluzente.

Que o silêncio em redor guarde a fragilidade
Translúcida que sois, e ouçam-se quase a medo
Os rumores quaisquer que em torno a vós se formem!

Toquem-vos docemente a sombra e a claridade...
Nem se turbe, jamais, ó lustres, o segredo
Das vibrações que em vós, musicalmente dormem!