domingo, 6 de agosto de 2017

BALADA DO MAL REAL

 



BALADA DO MAL REAL

 
Senhor Rei que bem se guarda
de jogar o pau mandado
que põe o pão sobre a mesa
e a mão no corpo embalado
 
Senhor rei do bom sorriso
e do olhar embuçado
que traz o mundo à cintura
e se deita do meu lado
 
Senhor rei e de abalada
passando-me à flor da boca
a casa que tenho passa
a vida que levo é pouca
 
Senhor rei tomai poder
do que viste em cova funda
mouros de terra a morrer
amar sempre e ser nunca
 
Senhor rei para manter-vos
não basta este gume de águas
este choro este receio
de pagar-vos só com mágoas
 
A coroa que alevantais
de sol de riso e de arroz
o vestido que me dais
de pena e suor de vós
 
Senhor rei que para amar-vos
não fora ermo o lugar
seriam fracos os braços
seria velho o falar
 
Senhor rei de sal e cedro
voltai vossa barca aos vossos
contai vossa renascença
pelo dentro dos meus ossos.
 
 
in “Novas Cartas Portuguesas” de:
MARIA ISABEL BARRENO, escritora (Lisboa, Portugal, 1939-2016).
MARIA TERESA HORTA, escritora e poetisa (Lisboa, 1937).
MARIA VELHO DA COSTA, escritora (Lisboa, 1938).
Imagem: pintura de Osnat Tzadok (Canadá)

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