sexta-feira, 4 de maio de 2018

JORGE DE SENA – ALGUMA POESIA e outras considerações desagradáveis



JORGE DE SENA
(Lisboa, Portugal, 1919 - Santa Barbara, Califórnia, 1978)
Poeta

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ALGUMA POESIA e outras considerações desagradáveis

A segunda série de Líricas Portuguesas, que o poeta João Cabral do Nascimento seleccionou, prefaciou e anotou, destina-se a completar a primeira série que foi organizada pelo poeta José Régio.

Trata-se de uma antologia em que há poesia, em que todos são poetas, mais ou menos felizes na expressão, mais ou menos espertos na «ideia»… Sente-se que a intenção foi quase sempre do poeta, que achou grandioso, gracioso ou oportuno falar de algo, com a sentimentalidade da ocasião , e comovido até às lágrimas da vaidade pelo espírito do seu talento verbal.

Mas salvam-se: a suave e dilacerante loucura de Ângelo de Lima; o populismo irónico de Afonso Duarte; a feminina eloquência de Florbela Espanca; o isolacionismo trágico de José Régio; a subtil rudeza de Miguel Torga; o pudor aparentemente áspero de Casais Monteiro; a sátira parnasiana ao simbolismo que António Feijó ia fazendo, tal como a raposa achava ainda verdes as uvas a que não chegava; o dramatismo desastrado de Manuel Laranjeira; a angústia mortal de António Patrício; a inspiração literária de Lopes Vieira; o cultismo pitoresco de Vitorino Nemésio; o garcialorquismo minhoto de Homem de Melo; o sábio e viril formalismo de Armindo Rodrigues; a melancolia provinciana de Alberto de Serpa: o discreto arcadismo de Carlos Queirós; as recordações infantis de Alfredo Guisado; a rebuscada simplicidade de António Botto; o dadaísmo inconsciente de António Navarro; e ainda o encanto satírico de João Saraiva; o hieratismo exótico de Osório de Castro; o erotismo retórico de Guedes Teixeira; a euforia junqueiriana de João de Barros; o saudosismo depurado de Mário Beirão (que escreveu «Ausências», poema incluído nesta antologia, e que é um dos mais perfeitos da nossa língua); a paradoxal expressão, nunca assaz louvada, de António de Sousa; o saudosismo diluído de Anrique Paço d´Arcos; a admirável segurança de João de Castro Osório; o supra-realismo incipiente de Edmundo Bettencourt; a aristocrática tristeza de Guilherme de Faria; o ultra-romantismo extemporâneo de Queirós Ribeiro; a forçada inspiração de Silva Gaio; a amena limpidez de António Fogaça; o António Nobre de S. Brás de Alportel que é Bernardo de Passos; o Pascoaes de Olhão, que é José Lúcio; os delicados sonetos de Américo Durão; os «incensos de oiro» de Luís de Montalvor; a «Violante de Cisneiros» de Côrtes-Rodrigues; a «poesia em pessoa». que é Augusto Casimiro, como Vitorino Nemésio lhe chamou algures; os sonetos acabados, como «tabatières à musique», na expressão de Claudel, de Cândido Guerreiro; o Diogo Bernardes e o Cancioneiro Geral do Dr. Júlio Dantas; o violino de Ingres que são os versos do notável prosador-poético Branquinho da Fonseca; o abastado bucolismo de Francisco Bugalho; a circunstancialidade de Fausto José; o antigo panteísmo de Correia de Oliveira; o delicado tradicionalismo de António Sardinha; a inspiração edificante de Moreira das Neves; as excelentes qualidades recitáveis de Fernanda de Castro; a renovada experiência de Campos de Figueiredo; e Cortês Pinto, Júlio Brandão, Augusto Gil… Porque também lá não falta Augusto Gil, o patriarca da «quadra popular» dos jogos florais e recreativos.

Citei, como se viu, os 50 poetas.


in “Mundo Literário” - 1946





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