ALBERTO GIRRI
(Buenos Aires, Argentina, 1919 – 1991)
Poeta e escritor
***
O DESESPERADO
Deixem-no gritar
com seu penetrante odor
de pródigo rondando como um abutre
pelos pecados da omissão.
Deixemos,
que a conformidade oculta
é artigo de sua vigília
fixa no amor.
Que a paz, peste de paz,
estímulo de negócios
para que agonizemos na cama
e de sua permanência ninguém se arrependa,
é seu intolerável fuste.
Que o nosso gemido,
vicioso presente anquilosando
o resplendor do que somos,
impede reconhecer-nos
à imagem e semelhança.
Que o fundo de sua dívida
é núpcias com a imundície,
onde o vinho fino, a gota de água,
a rosa inchada de azeite,
uma herança, descem a chorar.
Que a caridade que obedecemos,
perjura resposta
á sua única, devoradora solidão,
desconfia das obras.
Deixem-no gritar, deixemos,
devotos pobremente sensíveis
da Segunda Pessoa
que por ele abrasa.
Tradução: António Miranda
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