FRANCIS PONGE
(França,
1899 - 1988)
Poeta, escritor
***
A OSTRA
A ostra, do tamanho de um
seixo médio, tem uma aparência mais rugosa, uma cor menos uniforme,
brilhantemente esbranquiçada. É um mundo tenazmente cerrado. E no entanto abre-se:
há então que segurá-la no interior de um pano, usar uma faca amossada e pouco certa,
repetir várias vezes o gesto. Os dedos curiosos acabam cortados, as unhas partidas:
é um trabalho tosco. Os golpes dados marcam o seu invólucro, com círculos brancos,
como se fossem halos.
No interior acha-se um mundo inteiro, de beber e de comer: sob um firmamento (propriamente dito) de nácar,
os céus de em-cima afundam-se nos céus de em-baixo, para já só formar um
charco, um saco viscoso e esverdeado, que flui e reflui ao cheiro e à vista, franjado
de renda negra pelas bordas.
Por vezes raríssimas uma fórmula em pérola advém à sua goela de nácar, de que logo
se acha ornamento.
Tradução: Filipe Jarro
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