SALVATORE QUASIMODO
(Itália, 1901 - 1968)
Poeta
***
Laureado com o Nobel em
1959, Quasimodo desde muito jovem foi impressionado pelo espectáculo do
sofrimento humano. Durante a guerra, o poeta apegou-se aos tormentos
do povo. Após o conflito a sua poesia expressou os horrores da guerra e do
regime fascista.
***
CÂNTICOS
FILHO
-
E por que, mãe, cospes num cadáver
que
prende com a cabeça baixa, atado pelos pés
às
traves? E não te dão náusea os outros
baloiçantes
ao lado? Ah! aquela mulher,
as
suas meias de can-can macabro
e
garganta e boca de flores amassadas!
Não,
mãe, pára; grita à multidão
que
vá embora. Não é lamento, é escárnio,
é
alegria: já se grudam as moscas
aos
nós das veias. Atiraste contra
aquele
rosto, agora: mãe, mãe, mãe!
MÃE
-
Sempre cuspimos sobre cadáveres,
filho:
presos às grades de janelas,
a
mastros de navios, feitos cinzas
em
nome da Cruz, despedaçados pelas feras
por
um pouco de erva dos feudos.
E
fosse solidão ou tumulto,
olho
por olho, dente por dente,
após
dos mil anos de eucaristia,
o
nosso coração desejou aberto
o
outro coração que já abrira o teu,
filho.
Te arrancaram os olhos e tuas mãos
te
quebraram na procura do nome a trair-se.
Mostra-me
os olhos, dá-me aqui tuas mãos:
morreste,
filho! Porque morreste
podes perdoar: filho, filho, filho!
FILHO
-
Este mormaço repugnante, esta fumaça de
escombros,
as gordas verdes moscas
bagas
sobre ganchos: a ira e o sangue
gotejam
justamente. Não por ti
e
nem por mim, mãe: olhos e mãos ainda
me
furarão amanhã. Desde séculos
a piedade é o urro do assassinado.
29 de Abril de 1945
Tradução: Sílvio Castro
in “Segunda Guerra Mundial - Uma
Antologia Poética – Sammis Reachers