ISABEL WOLMAR
(Lisboa, Portugal, 21 de Março, 1933 – 21 de Julho,
2019)
Locutora,
apresentadora, produtora, repórter, actriz, poetisa, declamadora, cantora
***
OS
MEUS PAIS
“Foram
várias as pessoas que me marcaram enquanto cresci. O professor João Soares, o
Manuel Lereno, meu mentor, e a minha família, claro, sobretudo a minha mãe.
O
meu pai e a minha mãe eram pessoas muito diferentes. Ele era muito inglês, toda
a gente o achava um gentleman, encantador,
um amor de pessoa, mas era muito frio; ela era muito carinhosa.
O
meu pai não nos dava um beijo. Lembro-me que quando a minha irmã mais nova teve
um garrotilho, tinha ela uns sete anos, esteve a morrer, e quando voltou a
poder falar, disse à minha mãe: «mamã, afinal o papá gosta de mim. Ele deu-me
um beijo!»
A
mim, o meu pai só começou a dar-me beijos depois de eu me ter casado e ter
saído de casa, mas eu sei que ele gostava muito de mim. Eu era a sua
companheira dos concertos. Só que ele era muito distante, até com a minha mãe.
Ela dizia: «eu que gosto tanto de beijinhos e abraços, casei com o homem de que
gosto, mas que não me dá um carinho.» Só muito mais tarde é que eu comecei a
vê-lo de outra maneira. Por isso é que eu gostava de homens mais velhos, porque
gostava de ter tido um pai mais companheiro, que falasse, que fosse meu pai a
sério.
O
meu pai conciliava o seu trabalho como empregado de escritório no Diário de Notícias com a carreira de
compositor e pianista. De facto, eu venho de uma família de artistas de canto,
de piano e de violino.
Os nossos serões de infância eram uma coisa maravilhosa.
Quase todos os Sábados, reuniam-se lá em casa vários actores, poetas,
dramaturgos e músicos. Tínhamos uma sala grande, com cadeiras, como se fosse
uma plateia, e tínhamos os programas, como em qualquer teatro – feitos à mão
pelo meu pai!
Ele arranjava temas, por exemplo um serão de música clássica ou ligeira,
uma ópera, uma orquestra, e tudo vinha explicado no programa, bem como quem
participava. Iam lá casa, entre outros, o Paulo Alexandre, o Nuno de Almeida, a
Maria de Lourdes Resende, o António Calvário, a Simone de Oliveira, a Madalena Iglésias,
artistas que o meu pai começou a acompanhar de perto. Eram serões muito agradáveis.”
in “A Vida com um Sorriso” – Patrícia Costa Dias
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