ÁLVARO SALEMA
(Viana do Castelo, Portugal,
1914 - 1991)
Ensaísta, crítico
literário
***
STENDHAL (II)
(continuação)
Stendhal, protegido por Daru, grande
admirador das batalhas napoleónicas, foi pela primeira vez a Itália que nunca
mais deixou de ser a pátria decorativa e ardente da sua fantasia.
Em 1800 era
oficial de baixa patente num desses corpos militares esfarrapados e heróicos
que desenharam as cenas mais coloridas da chamada «epopeia» napoleónica:
bateu-se nos Alpes e conheceu alguns aspectos da batalha de Marengo; e, tendo
saído das fileiras em 1802, nem por isso deixou de acompanhar os factos mais
notáveis do «caporalismo» imperial como funcionário administrativo do exército.
Assistiu ao incêndio de Moscovo e à derrocada de Napoleão, observou com
realismo intelectual as tragédias da guerra, correu aventuras e amores entre
muitos desatinos.
De tudo isso lhe ficou uma cruel frieza para conhecer até ao
fundo as misérias e grandezas do ser humano, um amoralismo que só no movimento
desencadeado da acção e das paixões se compraz – e um aborrecimento doentio
para a vida calma a que teve de sujeitar-se daí em diante.
Foi a partir de
1815, reduzido ao «meio soldo» pela restauração dos Bourbons, que Stendhal
começou a publicar os seus livros para obter algum dinheiro e alimentar a imaginação
que a forçada quietude da existência deixara entregue a si mesma.
(continua)
in “Mundo Literário” - 1946
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