sábado, 14 de março de 2020

ABEL NEVES – Quatro vezes sete versos para aquela rapariga



ABEL NEVES
(Montalegre, Portugal, 1956)
Poeta, dramaturgo, romancista

***

Possuidor de uma vasta obra literária,  escreve desde romances e poesia a textos para cinema e televisão.  
Em 1990, foi coordenador de Dramaturgia no Estágio de Criação Dramática para jovens Actores e Autores Europeus no âmbito da Convenção Teatral Europeia.
Nos anos seguintes, foi professor convidado na Escola Superior de Teatro e Cinema, na Universidade de Évora e na Escola Superior de Música e das Artes do Espectáculo para leccionar na área de dramaturgia.  
Em 2009, recebeu o prémio Luso-Brasileiro de Dramaturgia António José da Silva com o texto Jardim suspenso e em 2014 foi distinguido com o prémio Autores 2014 pelo Melhor Texto Português Representado em 2013,  Sabe Deus pintar o Diabo.
Fonte: “Universidade de Coimbra” (excerto)

***


QUATRO VEZES SETE VERSOS PARA AQUELA RAPARIGA

Enquanto não vens nem tu sabes é assim
uma casa que só cheirasse a uvas de Setembro
Este quarto esta sala onde o som contínuo é Out of
Nowhere soprado pelo Charlie Parker
Há calma com vento que vem quente enquanto não vens
e podes ter a certeza que o soalho vai ter aroma de estações
A que menos entenderes para melhor a desejares

Entretenho-me com uma breve meditação
sobre o perfil de um velho índio apsaroke
e tenho-te rapariga na visão do vale dos bisontes
onde esperas o bafo morno do fim da tarde
ajeitando o lenço na cabeça e sorrindo
entre o voo de alguns insectos
e a recordação destes dedos que te escrevem

Não me leves a mal se te falo de coisas tão domésticas
mas neste falar assim é que as plantas destes vasos
crescem para o tecto e é lá que está o éden delas
ainda que o vá sendo sempre o ar e
a luz que tomam
cada dia perto muito perto das menores palavras
com que te aviso do paraíso tão à mão

Hoje sinto-me lesma será isto solidez?
e não tenho sexo nem para as horas
nem lei para esta coisa suave
que é dançar na metafísica como astronauta para lá da                    gravidade
Cá vou indo menina cá vou indo
e não me peças versos que os não dou
por os não saber fazer ou ler ou nada


1 comentário:

  1. Bom dia:- Puro brilhantismo poético como não podia deixar de ser.
    Gostei demais de ler
    .
    Feliz fim de semana

    ResponderEliminar

MALMEQUER

MALMEQUER Português, ó malmequer Em que terra foste semeado? Português, ó malmequer Cada vez andas mais desfolhado Ma...