RAUL BRANDÃO
(Porto, Foz do Douro, Portugal, 1867 - Lisboa, 1930) Escritor
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Publicou contos, livros de
viagens, peças de teatro, memórias e estudos históricos. A sua prosa simples e tensa
palpita de dramatismo e fogo interior, em clarões de idealismo no lírico anarquismo
niilista. Neto de um pescador, as suas páginas resumem simpatia e angústia ao evocarem
as desgraças dos humilhados e ofendidos, sob a directa influência da leitura de
Dostoievski, sendo neste aspecto caso ímpar na prosa portuguesa.
in “Livro dos Portugueses”
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A PRIMITIVA INFÂMIA
Desde que se cumpram certas cerimónias ou se respeitem
certas fórmulas, consegue-se ser ladrão e escrupulosamente honesto - tudo ao
mesmo tempo. A honradez deste homem assenta sobre uma primitiva infâmia. O
interesse e a religião, a ganância e o escrúpulo, a honra e o interesse, podem
viver na mesma casa, separados por tabiques. Agora é a vez da honra - agora é a
vez do dinheiro - agora é a vez da religião. Tudo se acomoda, outras coisas
heterogéneas se acomodam ainda. Com um bocado de jeito arranja-se-lhes sempre
lugar nas almas bem formadas.
in "Húmus" (citador)
Imagem: retrato de Raul Brandão (1928), por Columbano
Bordalo Pinheiro.
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