RAUL PROENÇA
(Caldas da Rainha, Portugal,
1884 – Porto, 1941)
Escritor, bibliotecário, filósofo
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TRADIÇÕES DO NOSSO PAÍS
Tradições, no nosso país,
são o empenho, a falta de iniciativa, de solidariedade, de coragem moral, o
egoísmo dos homens de fortuna (que se sentem socialmente desobrigados quando
deixam seus bens intactos ou acrescidos), o direito que cada um se reconhece,
que lhe reconhecem os tribunais, de desatar aos tiros à autoridade legítima,
porque não concorda com a maneira como ela decretou, por exemplo, sobre o aguilhão
dos bois…
Devemos amar, respeitar, consagrar, perpetuar essas tradições (que o
são inegavelmente), só porque são tradições? O dever do mestre não consistiria
– ao contrário do que pretende Barrès – em mostrar a sua fealdade, o seu dano,
a sua ilegitimidade?
Poderemos ter algum prazer ou alguma glória em continuar a
ver desenrolar-se a «procissão nacional» dos subservientes, dos apáticos, dos
pusilânimes, dos egoístas, dos inadaptados a toda a ordem social? Bons ou maus, os nossos gostos são nossos
– prega Maurras.
Que se diria, porém, de um pai que desejasse conservar os
vícios dos seus filhos pelo fútil motivo de que são deles e não doutro? Decerto
que a hipótese da loucura nos acudiria ao espírito.
Contrariar os vícios
nacionais – pode lá haver programa mais sensato, mais útil, mais benemerente de
educação nacional?
in “Seara Nova” -1929
Imagem: Raul Proença por
Carlos Botelho (Lisboa, 1899 -1982)
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