AS
PREFERÊNCIAS DO DIVINO
Um sacerdote passava
frente a uma humilde aldeia. Ouviu uns risos alvoraçados e aproximou-se para
ver a que se deviam. Havia uma mãe a dar de comer aos seus quatro filhos, mas o
que surpreendeu o sacerdote foi ver que também dava de comer a uma imagem da
divindade.
O sacerdote irritou-se e gritou: «Mulher blasfema, como te atreves a
brincar com a imagem de Deus?» Pegou na imagem e levou-a. Não podia permitir
que fizessem dela um brinquedo. As crianças ficaram muito tristes e a mulher
envergonhada.
O sacerdote colocou a imagem sagrada no templo. Essa noite, em sonhos,
Deus apareceu-lhe e disse: «Insensato! Quem te manda meter o nariz onde não és
chamado? Não aceitarei nenhum sacrifício nem qualquer oferenda dos sacerdotes,
porque onde eu era realmente feliz era naquela casa, com aqueles meninos.
Portanto, assim que acordares amanhã, leva-me a eles. O templo é escuro e
triste.»
A
solenidade é o símbolo dos medíocres. O sábio tem um grande sentido de humor e
o seu coração transborda de ternura e seu entendimento, de compreensão. Uma
religião que fecha as portas à alegria e que não celebra a vida perdeu o seu
sentido original de aliviar o sofrimento e pôr a uso os meios para que as
criaturas sejam mais felizes. Não se chega ao Absoluto com oferendas vazias e
rituais empedernidos, mas sim pela vontade de contribuir para o bem-estar e a
alegria dos outros.
RAMIRO
CALLE, (Madrid, Espanha, 1943), escritor
Imagem:
pintura de Paula Rego
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