ISAAC ASIMOV
(Rússia, 1919 – EUA,
1992)
Escritor e bioquímico
Foi considerado um dos mais importantes escritores de ficção científica
do século XX. A sua obra mais famosa é a série Fundação (Trilogia da Fundação),
que faz parte da série do Império Galáctico.
***
Mas afinal, o
que é inteligência?
Quando
estava no exército, fiz um desses testes de aptidão intelectual que todos os
soldados realizam. Minha pontuação foi de 160, o normal é 100. Ninguém na
base tinha visto uma nota dessas e durante duas horas eu fui o assunto
principal.
(Não
significou nada – no dia seguinte eu ainda era um soldado raso da KP – Kitchen
Police)
Durante
toda minha vida consegui notas como essa, o que sempre me deu uma ideia de que
eu era realmente muito inteligente. E eu imaginava que as outras pessoas também
achavam isso.
Porém, na verdade, será
que essas notas não significam apenas que eu sou muito bom para responder um
tipo específico de perguntas académicas, consideradas pertinentes pelas pessoas
que formularam esses testes de inteligência, e que provavelmente têm uma
habilidade intelectual parecida com a minha?
Uma
vez conheci um mecânico de automóveis que de acordo a minha estimativa não
poderia superar os 80 pontos nessas provas de inteligência. Sempre tive a
certeza que era bem mais inteligente que ele.
Entretanto,
quando acontecia algo errado com o meu carro eu observava com ansiedade
enquanto ele analisava o meu carro, enquanto proferia termos para mim
desconhecidos, mas que levava em conta como se ele fosse um sábio em um oráculo
divino. No fim das contas, ele sempre consertava meu carro.
Pois bem, vamos supor que meu mecânico tivesse feito as perguntas para um teste
de inteligência. Ou quem sabe fossem formuladas por um carpinteiro, ou por um
agricultor, ou, de facto, qualquer pessoa que não tivesse uma vida académica.
Qualquer uma dessas pessoas que fizesse o teste comprovaria minha
completa ignorância e estupidez.
Em
um mundo onde eu não pudesse usar a minha formação académica e meus talentos
verbais, mas tivesse que fazer algo complicado ou difícil, manualmente, eu me
daria muito mal.
Minha inteligência, então,
não é absoluta, mas é algo imposto em uma função de uma pequena parcela
da sociedade em que vivo.
Ainda
sobre o mecânico.
Ele tinha o costume de
contar-me piadas sempre que me encontrava. Uma vez levantou a cabeça debaixo do
capô do carro para dizer:
– Doutor, um garoto
surdo-mudo entrou em uma loja de ferragens para pedir pregos. Pôs dois dedos
juntos sobre o balcão e depois fez um movimento de martelar com a outra mão. O
empregado trouxe-lhe um martelo. Sacudiu a cabeça e assinalou os dois dedos que
estava martelando. O empregado trouxe-lhe os pregos. Escolheu o tamanho que
queria, e se foi. Bom, doutor, logo depois entrou um cego na loja. Queria
tesouras. Como acha que lhe pediu por elas?
Rapidamente
levantei a mão direita e fiz uns movimentos com os dedos simulando uma tesoura.
Ele caiu em gargalhadas e disse:
–
Mas você é muito burro mesmo! Ele simplesmente abriu a boca e usou a voz para
pedir.
Depois
de recuperar o fôlego, o mecânico disse:
–
Estou fazendo essa pegadinha com todos os clientes hoje.
–
Muitos caíram?
–
Poucos. Mas tinha certeza absoluta de que funcionaria com você.
–
Por quê? – perguntei.
–
Porque você estudou muito doutor, sabia que não podia ser muito inteligente.
E eu tive a incómoda
sensação de que ele estava falando a verdade.
Texto retirado de sua
autobiografia “It´s Been a Good Life".
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