sexta-feira, 23 de outubro de 2020

ALDA LARA - Testamento



ALDA LARA
(Benguela, Angola, 1930 - Cambambe, 1962)
Poetisa

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Poeta da "Geração Mensagem", a escritora demonstrou, desde cedo, o seu amor pela arte. Tornou-se uma exímia declamadora. Nos seus recitais de poesia, em Lisboa e em Coimbra, Alda Lara divulgava a poesia dos poetas do além-mar. 

Naquela época, praticamente ninguém conhecia a poesia negra, sobretudo a africana. Alda Lara carregava, na palavra, toda a ternura e a firmeza de uma verdadeira mulher africana, que se solidariza com o drama do outro e lhe dirige o olhar de uma atenta máter. Era uma narradora de reconhecido quilate. 

in “ União dos Escritores Angolanos” (excertos)

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TESTAMENTO

À prostituta mais nova
Do bairro mais velho e escuro,
Deixo os meus brincos, lavrados
Em cristal, límpido e puro...

E àquela virgem esquecida
Rapariga sem ternura,
Sonhando algures uma lenda,
Deixo o meu vestido branco,
O meu vestido de noiva,
Todo tecido de renda...

Este meu rosário antigo
Ofereço-o àquele amigo
Que não acredita em Deus...

E os livros, rosários meus
Das contas de outro sofrer,
São para os homens humildes,
Que nunca souberam ler.

Quanto aos meus poemas loucos,
Esses, que são de dor
Sincera e desordenada...
Esses, que são de esperança,
Desesperada mas firme,
Deixo-os a ti, meu amor...
Para que, na paz da hora,
Em que a minha alma venha
Beijar de longe os teus olhos,

Vás por essa noite fora...
Com passos feitos de lua,
Oferecê-los às crianças
Que encontrares em cada rua...

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