quinta-feira, 31 de outubro de 2019

SEGUNDA GUERRA MUNDIAL - MIKLÓS RADNÓTI – Céu Espumante



                               MIKLÓS RADNÓTI
(Hungria, 1909 – 1944)
Poeta, tradutor

***

Durante a guerra passou por diversas dificuldades, vindo a ser preso e enviado ao campo de concentração de Bor. Durante uma das chamadas Marchas da Morte, onde prisioneiros eram obrigados a deslocarem-se a pé por centenas e até milhares de quilómetros, Radnóti, já debilitado, foi por fim executado e sepultado em vala comum. Após a exumação de seu cadáver, em 1946, foi encontrado no bolso de seu casaco um caderno com os seus últimos poemas, publicados sob o título de Tajtékos ég (Céu Espumante).


***
CÉU ESPUMANTE


No céu que espuma, a lua oscila.
Estar vivo me causa espécie.
A morte assídua espreita a Idade:
quem ela encontre, empalidece.
O ano grita e depois desmaia.
(Gritara olhando ao seu redor.)
Que Outono ronda-me de novo?
Que Inverno embotado de dor?
Sangrava o bosque; mesmo as horas
sangravam no vaivém dos dias.
Ventos riscavam, sobre a neve,
cifras enormes e sombrias.
Já vi de tudo; o ar me esmaga
com seu peso; um silêncio cresce
ruidoso, cálido e me abraça
como fez antes que eu nascesse.
Detenho-me junto de um tronco
que agita iroso as frondes plenas
e estende um galho. Há-de esganar-me?
Não é fraqueza ou medo – apenas
cansaço. Calo. E o galho apalpa
os meus cabelos, mudo, aflito.
Cabe esquecer – mas não há nada
de que já tenha me esquecido.
Espuma afoga a lua; o miasma
estria os céus, verde e agressivo.
Sem pressa, enrolo com cuidado
o meu cigarro. Eu estou vivo.




Tradução:Nelson Ascher
in “Segunda Guerra Mundial - Uma Antologia Poética – Sammis Reachers




Sem comentários:

Enviar um comentário

MALMEQUER

MALMEQUER Português, ó malmequer Em que terra foste semeado? Português, ó malmequer Cada vez andas mais desfolhado Ma...