CRISTOVAM PAVIA
(Lisboa, Portugal, 1933 – 1968)
Poeta
***
"A poesia de
Cristovam Pavia é a revelação de si próprio, de uma personalidade em conflito
com o mundo em que vive e que procura uma fuga pela recuperação da infância
morta, pela aceitação do seu conhecer-se diferente e despojado do que lhe é
mais caro (a infância, o amor, o espaço e o tempo em que ambos se situavam), a
transformação do seu próprio ser pelo sofrimento, num movimento de ascese e de
autodestruição, quando o poeta atinge a consciência de si próprio e da sua voz."
José Bento, poeta, em "Sobre a Poesia de Cristovam Pavia", in “Poesia de Cristovam Pavia”
***
AO MEU CÃO
Deixei-te
só, à hora de morrer.
Não
percebi o desabrigado apelo dos teus olhos
Humaníssimos,
suaves, sábios, cheios de aceitação
De
tudo... e apesar disso, sem o pedir, tentando
Insinuar
que eu ficasse perto,
Que, se me fosse, a mesma
era a tua gratidão.
Não
percebi a evidência de que ias morrer
E
gostavas da minha companhia por uma noite,
Que
te seria tão doce a minha simples presença
Só
umas horas, poucas.
Não
percebi, por minha grosseira incompreensão,
Não
percebi, por tua mansidão e humildade,
Que
já tinhas perdoado tudo à vida
E
começavas a debater-te na maior angústia, a debater-te com a morte.
E deixei-te só, à beira da
agonia, tão aflito, tão só e sossegado.
Sem comentários:
Enviar um comentário