(Redondo, Portugal, 1887 — Évora, 1975)
Historiador,
crítico literário, professor
***
À
PERTURBADORA
Olho-te
muita vez tão fixamente,
com
tal desejo a crepitar no olhar,
que
ficas a pensar, vaidosa e crente:
— Mais duas lâmpadas no
meu altar…
Vê
lá, porém, não te envaideça a ideia
que
nestes olhos — lâmpadas votivas —
arda
o álcool subtil que em nós ateia
paixões candentes como
chamas vivas…
Eu
sou romeiro de mais duma santa
e
a todos presto um culto assim — banal.
Se
não encontro — a ventura é tanta! —
mais que fragmentos do meu
santo Graal!…
De
alguém eu amo a santidade calma
e
os gestos brandos e pacificantes…
E,
envolta em seu olhar, minha alma
veste alma túnica em
rituais distantes…
Há
outra — inacessível Peregrina! —
em
que adoro a perfeição sonhada,
fê-la
o Senhor numa hora sossegada,
sem descuido ou tremor na
mão divina…
Mas
em ti amo a graça acidulada
por
uma gota de cinismo ingénuo;
muito
mais perturbante e desejada
que o vinho mais alcoólico
do Reno!
E
amo-te a boca… irregular gomil.
Quando
abre em riso, sente-se evolar
não
sei que odor de sensação subtil…
(Fermenta nela os beijos
que hás-de dar?…)
E
a graça dos teus olhos pequeninos!
São
duas frestas dum "hyaly" do Oriente,
onde
a tua alma — uma sultana ardente —
às vezes surge, a fulminar
destinos!
Mas
o que mais me turba é o mistério
da
tua carne em febre de desejo,
e,
assim, a arder, radiando em halo etéreo,
como se a Virgem lhe
aflorasse um beijo…
Eis
quanto eu amo em ti. É muito?… É pouco?…
Paixão…
não creio. Isto é - bem podes ver,
de
menos, para seguir-te como louco,
mas demais para te olhar
sem estremecer!
in ‘Antologia de poetas Alentejanos’
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