segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

ANGOLA – Alda Lara : Testamento

 
 
 
 
 
 
 
 

Alda Lara (Benguela, Angola, 1930 – Cambambe, Angola, 1962).

Orlando de Albuquerque, poeta e escritor moçambicano, radicado em Angola, escreveu no prefácio do livro de Poemas de Alda Lara:

A sua poesia caracteriza-se por uma intensa angolanidade implícita e, sobretudo, por um extremo amor e carinho, quase ternura, pelos outros. Ternura de menina-mulher, que sofria com os sofrimentos alheios, que vibrava com as desgraças da sua terra […]”.

 
 Testamento


À prostituta mais nova
Do bairro mais velho e escuro,
Deixo os meus brincos,
lavrados
Em cristal, límpido e puro...

E àquela virgem esquecida
Rapariga sem ternura,
Sonhando algures uma lenda,
Deixo o meu vestido branco,
O meu vestido de noiva,
Todo tecido de renda...

Este meu rosário antigo
Ofereço-o àquele amigo
Que não acredita em Deus...

E os livros, rosários meus
Das contas de outro sofrer,
São para os homens humildes,
Que nunca souberam ler.
Quanto aos meus poemas loucos,
Esses, que são de dor
Sincera e desordenada...

Esses, que são de esperança,
Desesperada mas firme,
Deixo-os a ti, meu amor...

Para que, na paz da hora,
Em que a minha alma venha
Beijar de longe os teus olhos,
Vás por essa noite fora...

Com passos feitos de lua,
Oferecê-los às crianças
Que encontrares em cada rua...


Alda Lara

2 comentários:

  1. saravá...no "OXALÁ" na tela onde te pinto ....eu sinto-me .

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  2. Tenho o livro original, 4a edição, onde está tb o citado prefácio, e na página desse poema imortal, aparece a data e local “Lisboa, 1950”. Deduzo q foi qdo ela estava na faculdade de medicina de Lisboa.

    Morreu com apenas 32 anos, mas quem escreve assim nunca morre!

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