MARIA ISABEL BARRENO
(Lisboa, Portugal, 1939 – 2016)
Escritora, ensaísta, artista plástica
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Co-autora, em 1971, de Novas Cartas Portuguesas, esteve
implicada no chamado Processo das Três
Marias, tendo sido um dos nomes de vanguarda do movimento feminista
português.
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Célia e Celina
(…) Era uma vez uma menina.
Vivia com os pais, numa bela casa, junto a uma grande cidade. A casa ficava
numa colina, e daí via-se a cidade toda. Atrás da colina começava uma enorme
floresta. A menina ia passear à cidade, ia ao mercado, ia à escola. E passeava
também na floresta. Gostava muito de andar sozinha no meio das árvores das
flores e dos animais. Conversava com eles.
Um dia, viu uma fada. A fada
não lhe disse nada, olhou-a e sorriu. A menina também não disse nada, não ficou
admirada nem fez perguntas. Ela sabia que existiam fadas, embora ninguém
falasse nisso. Naquela terra as pessoas não falavam nas coisas mais
importantes, porque essas as coisas que existiam mesmo, e falando nessas coisas
eles podiam sumir: ficariam escondidas debaixo das palavras, esquecidas.
A menina ficou olhando a fada,
e ficou feliz, completamente feliz. Sentiu que a visão da fada seria sempre um
sol na sua vida. O pai da menina era um comerciante abastado, e viajava muito
por causa dos seus negócios. Não era muito rico, mas ganhava bastante dinheiro,
e todos viviam bem naquela casa.
Um dia em que o pai da menina deveria voltar de uma das suas viagens, não
voltou. A mãe e a menina esperaram-no toda a noite e ele não apareceu. No dia
seguinte soube-se na cidade que andava um bando de salteadores atacando quem
passava na estrada – na estrada por onde deveria ter regressado o pai da
menina. (…)
in “Célia e Celina”
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