sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Al Berto - Mais Nada se Move em Cima do Papel

 
 
 
 
 

Al Berto (Coimbra, Portugal, 1948 – Lisboa, Portugal, 1997) foi poeta, pintor e editor.

A temática da sua poesia reflecte a perspectiva marginal da sociedade.

A obra de Al Berto foi reunida no volume O Medo.

 

 

Palavras de Al Berto:

“A eternidade não é lerem-me dentro de 50 ou 60 anos ou ficar na história da literatura portuguesa. Só espero que meia dúzia de doidos me leiam agora e isso os toque.”
 
 


Mais Nada se Move em Cima do Papel
 
mais nada se move em cima do papel
nenhum olho de tinta iridescente pressagia
o destino deste corpo

os dedos cintilam no húmus da terra
e eu
indiferente à sonolência da língua
ouço o eco do amor há muito soterrado

encosto a cabeça na luz e tudo esqueço
no interior desta ânfora alucinada
desço com a lentidão ruiva das feras
ao nervo onde a boca procura o sul
e os lugares dantes povoados

ah meu amigo
demoraste tanto a voltar dessa viagem
o mar subiu ao degrau das manhãs idosas
inundou o corpo quebrado pela serena desilusão
assim me habituei a morrer sem ti
com uma esferográfica cravada no coração
 

Al Berto, in “O Medo”
 

 
 

 

1 comentário:

MALMEQUER

MALMEQUER Português, ó malmequer Em que terra foste semeado? Português, ó malmequer Cada vez andas mais desfolhado Ma...