JOSÉ DE CASTRO
(Paço de Arcos, Portugal, 1931 -
Lisboa, 1977)
Actor
***
José de Castro parecia, por vezes, saído de uma peça de Shakespeare. Era um ser que transportava o mistério, e quem o transporta mostra-se indefinido e trágico, e desprotegido.
A
vida que a natureza transmite, sobrepôs a que a inteligência modela. A sua foi,
desde muito novo, de invenção, de projecção. Uma parte dela fez-se-lhe
secreta-jogo de espelhos levando para o exterior de si reflexos de si, como se
não tivesse existência precisa.
Dominava
como poucos a técnica da imposição, do convencimento, do envolvimento. Possuía
a capacidade da transfiguração, de ser o que interpretava, de fazer os outros
acreditar no que comunicava. O seu segredo não estava tanto no que dizia, mas
na maneira como dizia; não na reflexão que despertava, mas na hipnose que
gerava.
Sabia
que a acção só resulta se emanar do desejo, do sonho por ela.
Foi passeando pelas ruas de Paço de Arcos, e Paço de Arcos mostrava-se nesses anos um espaço com tempos, que arquitectou muito do que viria a ser a sua utopia.
Humanista
e universalista, comungava a diversidade da vida, do amor, da sensualidade.
Deixava-se, sem embaraço, conquistar pelas pessoas, pela música, pela comida,
pelos odores, pelas cores.
***
ARY DOS SANTOS dedica a
José de Castro, em evocação prestada no ano de 1983, este soneto vibrante:
OLHOS DE TRAGÉDIA
«Tinhas no rosto as máscaras antigas
da poesia e da farsa. Da comédia
Tinhas por vezes nardos e urtigas
Nos teus olhos velados de Tragédia.
Despojado de tudo tu soubeste
dar a Todos aquilo que nos falta.
O talento maior com que acendeste
As tuas próprias luzes da ribalta.
Mas o teu coração era ternura.
Na tua voz corria a água pura
Da inocência não. Mas da verdade.
Resta de ti a ilha de um tesouro
Meu Irmão: a memória quando é de outro
não é saudade não. É amizade»
in ”JOSÉ DE CASTRO – Fotobiografia”
– FERNANDO
DACOSTA (Caxito,
Angola, 1945), romancista, dramaturgo, jornalista.
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