ANTÓNIO JOSÉ FORTES
(Póvoa de Santa Iria, Portugal, 1931 – Lisboa, 1988)
Poeta
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Poeta ligado ao movimento surrealista, integrou o chamado "Grupo do Café Gelo".
Algumas das suas publicações: 40 Noites
de Insónia de Fogo de Dentes Numa Girândola Implacável e Outros Poemas, Uma Faca nos Dentes, Corpo de Ninguém.
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O Poeta em Lisboa
Quatro horas da tarde.
O poeta sai de casa com
uma aranha nos cabelos.
Tem febre. Arde.
E a falta de cigarros faz-lhe os olhos mais belos.
Segue por esta, por
aquela rua
sem pressa de chegar
seja onde for.
Pára. Continua.
E olha a multidão, suavemente, com horror.
Entra no café.
Abre um livro
fantástico, impossível.
Mas não lê.
Trabalha - numa música secreta, inaudível.
Pede um cigarro. Fuma.
Labaredas loucas
saem-lhe da garganta.
Da bruma
espreita-o uma mulher nua, branca, branca.
Fuma mais. Outra vez.
E atira um braço
decepado para a mesa.
Não pensa no fim do
mês.
A noite é a sua única certeza.
Sai de novo para o
mundo.
fechada à chave a
humanidade janta.
Livre, vagabundo
dói-lhe um sorriso nos lábios. Canta.
Sonâmbulo, magnífico
segue de esquina em
esquina com um fantasma ao lado.
Um luar terrífico
vela o seu passo transtornado.
Seis da madrugada.
A luz do dia tenta
apunhalá-lo de surpresa.
Defende-se à dentada
da vida proletária, aristocrática, burguesa.
Febre alta, violenta
e dois olhos terríveis,
extraordinários, belos.
Fiel, atenta
a aranha leva-o para a cama arrastado pelos cabelos.
in”Uma Faca nos Dentes”
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