Um
Morto Alegre
Numa terra sem vida, abandonada e dura,
quero eu mesmo cavar um buraco profundo,
onde possa esticar minha velha ossatura
para dormir tranqüilo, esquecido do
mundo.
Odeio o testamento, odeio a sepultura;
a esmolar compaixão como um vil
vagabundo,
antes quisera ver minha carcaça
impura,
inda viva servir de pasto a um corvo imundo.
Vermes, amigos meus sem olhos, sem ouvidos,
um morto vos procura alegre e
descuidado!
Filhos da podridão, asquerosos e tortos.
Sem pena percorrei meus restos corrompidos,
e dizei-me se pode inda ser torturado
este corpo sem alma e mais morto que os
mortos!
Charles Beaudelaire
Tradução:
Paulo César Pimentel
Ilustração: pintura rupestre com 14.000 anos localizada
na região de Acacus, maciço
rochoso no oeste da Líbia, no deserto do Saara. Esta área está inscrita na
UNESCO, desde 1985, como Património Mundial, devido à importância das pinturas
rupestres.
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