ANA
HATHERLY
(Porto, Portugal, 1929 – Lisboa, 2015)
Professora,
escritora, artista plástica
***
Tisana 45
De cada vez que respiro
sei que alternadamente perco e recupero o meu corpo. Depois penso que é na
praia-mar da respiração que o meu corpo de forma, nesse intervalo. (Quando as
pessoas dormem ou estão no cinema, por exemplo, o ar do recinto fica
alternadamente cheio e vazio de corpos!) Respirar o corpo para fora inspirar o corpo
para dentro. Eis como a ginástica é uma forma de vampirismo. Penso nisto quando
estou na praia olhando um homem deslizar numa prancha por uma onda fora. De repente
desequilibra-se e cai. Tudo o que é profundo se revela à superfície.
Estou aqui e contemplo o suicídio
dos objectos habituais. Na mutilação da própria cadeira em que me sento vejo a morte
lenta e saturada que consiste na imolação pela comunicação. Na minha frente desmorona
imperceptível uma mesa. Ia falar mas já era tarde. Os vidros estavam todos embaciados.
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