FRIEDRICH NIETZSCHE
(Reino
da Prússia, 1844 – Império Alemão, 1900)
Filósofo, filólogo, poeta
***
Do Espírito de Gravidade
«A minha linguagem – é a do povo: linguagem
muito forte e muito franca para os delicados. E a minha palavra parece ainda
mais insólita aos escritorzecos e aos rabiscadores de todas as qualidades.
«A minha mão – é a mão de um louco. Pobres de
todas as mesas, de todas as paredes, de quanto oferece ainda um campo livre
para loucos arabescos, para rabiscos de louco!
«O meu pé – é casco de cavalo. Trota e galopa a
despeito de todos os obstáculos, para cima e para baixo pelos campos, e as suas
correrias rápidas dão-me um prazer diabólico.
«O meu estômago - não será antes um estômago de
águia? O que ele prefere é carne de cordeiro. Mas é certamente um estômago de
ave.
«Sustentado com uma carne inocente, satisfeito
com pouco, sempre pronto para o voo, impaciente por voar, elevar-me, eis como
sou. Como não havia de ter alguma coisa de ave?
«E é sobretudo por odiar o espírito de
Gravidade que tenho alguma coisa de ave; na verdade, sou seu inimigo mortal,
abonado, jurado! Para onde, então, não voou já o meu ódio, desencaminhado?
«A este respeito poderia fazer uma canção - e
cantá-la-ia, se bem que, sozinho numa sala vazia, só posso cantar para os meus
próprios ouvidos.
«Outros cantores precisam de uma sala cheia
para sentir a garganta harmoniosa, a mão eloquente, o coração alerta, o olhar
expressivo – mas não me pareço com eles.»
in “Assim Falava Zaratustra”
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