A
MULHER COMO CENTELHA ARTÍSTICA
Todas
as manhãs, antes do marido chegar para almoçar, a mulher penteada, maquilhada,
harmoniosamente vestida e sorridente.
Não é um carinhoso objecto
de arte?
Quando
sai, escolhe o chapéu melhor, enfia o vestido predilecto, deita uma gota de
perfume nas mãos e outra no lóbulo da orelha e olha mais uma vez, para o
espelho.
Encontra-se mesmo a sair a
porta. Não fica encantado?
Depois,
como prefere vê-la? De sapatos quadrados e rasos, vestido escorrido, cabelo
cortado à homem, passo largo, chapéu qualquer – ou vendo-se que folheia um
livro, não deixando de comprar uma revista e trincando gulosamente a já
tradicional tortazinha de maçã?
Seja franco. A feminista
nunca foi o seu fraco, pois não?
Outra
vez em casa. O quebra-luz dá mais conforto ao seu maple. Ela fixa o rádio onde sabe que lhe agrada. Tem um delicioso
vestido de casa em veludo azul com fourreau
prateado.
Sorri.
Você é feliz só de a ver,
só de a sentir a seu lado.
É uma boneca? E porque diz
tanto mal do pó de arroz?
Que, afinal, não é uma boneca, não, é uma obra de arte – com ternura, beleza e
dedicação. Vá, cale-se…consinta em ser plenamente feliz.
in “Mundo Gráfico”
(1940–1948), revista quinzenal de “Actualidades Nacionais e Internacionais.
“Página Feminina” de autoria de Aurora Jardim - 1941.
Imagem: pintura de Amedeo
Modigliani (Livorno, Itália, 1884 – Paris, França, 1920).
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