domingo, 7 de abril de 2019

BEATRIZ COSTA - A Brasileira dos anos 30! - (IV)



BEATRIZ COSTA
(Charneca do Milharado, Portugal, 1907 - Lisboa, 1996)
Actriz de teatro e cinema

***
Perto do Teatro da Trindade, em Lisboa, fica o célebre café A Brasileira do Chiado.
Nessa altura, uma senhora não frequentava lugares em que os homens permanecessem…
 

***
(continuação)


A BRASILEIRA DOS ANOS 30!
 

Ferreira de Castro era económico nas suas aparições pel´A Brasileira. Vivia muito retirado e passava grande parte do tempo no estrangeiro. Quando aparecia, provocava dezenas de sorrisos, porque no dia em que nasceu esse homem esgotou o stock de simpatia no mercado nacional! O seu livro A Selva é um dos mais belos da língua de Camões e Ruy Barbosa.

Ramada Curto, advogado e autor dramático. Foi um dos espíritos mais brilhantes que viram envelhecer o João Franco, o mais típico e bondoso garçon que a Galiza exportou para Portugal. João foi amigo de todos nós. O Dr. Ramada Curto era um dos fregueses predilectos do bondoso garçon. João sabia conversar, tinha ideias próprias e originais.

Ramada Curto vivia na Rua da Misericórdia, perto do Chiado, num quarto andar sem elevador. Como o médico o proibisse de subir escadas, ele resolveu contratar dois «moços de esquina», que o levavam a braços até à residência, e assim conservou o coração tranquilo com a ajuda do aluguer barato…

O Dr. Ramada Curto era homem de muito espírito. Aproveitava tudo isto para construir as mais graciosas blagues. Tinha amigos nas sete colinas de Lisboa. Isso trazia-lhe uma clientela especial…

Um dia resolveu fazer a seguinte comunicação: se os amigos não me pagarem, os inimigos não me pagam com certeza!

Esteve gravemente doente, e quando apareceu no «nosso» café todos queriam saber com detalhes o que tinha acontecido. A doença fora difícil e longa. Foi nessa altura que o nosso querido amigo resolveu mandar imprimir caprichosamente toda a história dos seus padecimentos… «Então, Dr. Ramada Curto, o que foi isso?» Ele metia a mão no bolso e, sem uma palavra, entregava o papel e despedia-se. Não era homem para perder tempo com descrições mórbidas, tão ao gosto da nossa gente…

Um dia, este homem notável foi procurado no seu escritório da Rua Nova do Almada por uma comissão, que lhe preparava um grande jantar de homenagem. Recebeu-os com aquela simpatia que não cabia no Chiado. Tomou conhecimento de que já havia para cima de trezentas inscrições, ouviu e, depois de um agradecimento, no melhor português de Camilo, disse-lhes: «Meus amigos, eu estou necessitado de um sobretudo… Troquem lá o banquete por isso…»
Ramada Curto, um homem grande, um homem inesquecível!

(continua)



in “Sem Papas na Língua” – Memórias - 1974

                                

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