Carta de Mário de Sá-Carneiro a Fernando Pessoa
Meu querido Amigo.
A menos de um milagre na próxima
segunda-feira, 3 (ou mesmo na véspera), o seu Mário de Sá-Carneiro tomará uma forte dose
de estricnina e desaparecerá deste mundo. É assim tal e qual – mas custa-me tanto a escrever esta carta
pelo ridículo que sempre encontrei nas «cartas de despedida»... Não vale a pena lastimar-me, meu querido Fernando:
afinal tenho o que quero: o que tanto sempre quis – e eu, em
verdade, já não fazia nada por aqui... Já dera o que tinha a dar.
Eu não me mato por coisa
nenhuma: eu mato-me porque me coloquei pelas circunstâncias – ou melhor: fui colocado por elas, numa áurea
temeridade – numa situação para a qual, a meus olhos, não há outra saída. Antes assim. É a única maneira de fazer
o que devo fazer.
Vivo há
quinze dias uma vida como sempre sonhei: tive tudo durante eles: realizada a
parte sexual, enfim, da minha
obra – vivido o histerismo do seu ópio, as luas zebradas, os mosqueiros roxos da sua Ilusão. Podia ser
feliz mais tempo, tudo me corre, psicologicamente, às mil maravilhas, mas não tenho
dinheiro. [...]
Mário de Sá-Carneiro, 31 de Março de 1916.
Imagem: Caricatura de Mário de Sá-Carneiro por Almada Negreiros.
Me perdoe, mas acho que só ele que precisava disto, pra ser feliz; pior, que nem saberia se foi ! A felicidade não mora fora da gente, mora dentro do coração. De chinelinho de dedo, num casebre, pequenina que fosse, com família reunida, o quê bastasse pra viver, seria um bom motivo pra felicidade entrar, se acomodar e permanecer. Felicidade, nós determinamos e basta que sejamos feliz com isto, que ela permaneça. O homem é infeliz porque busca, ou além do que pode, ou deseja o que não lhe pertence. E isto, com muito ou pouco dinheiro, tanto faz, nunca será feliz.
ResponderEliminarMe perdoe, mas acho que só ele que precisava disto, pra ser feliz; pior, que nem saberia se foi ! A felicidade não mora fora da gente, mora dentro do coração. De chinelinho de dedo, num casebre, pequenina que fosse, com família reunida, o quê bastasse pra viver, seria um bom motivo pra felicidade entrar, se acomodar e permanecer. Felicidade, nós determinamos e basta que sejamos feliz com isto, que ela permaneça. O homem é infeliz porque busca, ou além do que pode, ou deseja o que não lhe pertence. E isto, com muito ou pouco dinheiro, tanto faz, nunca será feliz.
ResponderEliminar