Lenda da Lavadeira de Alverca
Em tempos passados, uma mulher, que ganhava a vida a lavar roupa das gentes do Fundão, era pouco temente a Deus e descuidada com as regras da igreja. Para ela, ser dia santo ou não, era quase a mesma coisa. Muitas vezes lhe chamaram à atenção para esse defeito. Mas ela fazia orelhas moucas.
No dia de Quinta-Feira de Ascensão, ninguém podia fazer trabalho normal, porque isso era pecado grave. Muitas pessoas faziam até a comida na véspera, para respeitarem totalmente o dia, sem qualquer trabalho.
Certo ano, era dia de Quinta-Feira de Ascensão, dia santificado e muito respeitado pelos crentes, como ensinavam os Mandamentos da Lei de Deus, a mulher, que tinha uma trouxa de roupa para lavar, não quis saber que era dia santo de guarda. Pegou na roupa e foi para a ribeira de Alverca, que fica cerca de um quilómetro a Nascente do Fundão, para a lavar logo pela manhã.
Passou pela ribeira uma mulher que a avisou para não trabalhar, porque era Quinta-Feira de Ascensão. A lavadeira riu-se e continuou a esfregar a roupa. Chega a uma hora da tarde, pela hora nova, e a lavadeira continuava a bater com a roupa no lavadouro, para lhe tirar a sujidade.
O tempo, entre a uma hora e as duas horas da tarde, era chamado a hora da reza, porque foi nessa hora que Nosso Senhor subiu ao Céu para sempre. Era uma hora em que os sinos avisavam as pessoas para rezarem, em grupos ou sozinhas, onde quer que estivessem. Nessa hora, os passarinhos batiam as asas e cantavam e as folhas das árvores punham-se em cruz, em louvor de Nosso Senhor.
Pouco depois de uma hora, ouviu-se um grande grito de aflição, pela ribeira da Alverca e a lavadeira desapareceu com a roupa. Tudo se sumiu, como castigo, por não ser respeitado um dia sagrado.
Durante muitos anos, em Quinta-Feira de Ascensão, durante a hora da reza, quando os ares estavam serenos, ouvia-se, na ribeira da Alverca, sem que ninguém lá estivesse, o bater da roupa nas pedras e os choros da lavadeira pecadora. Era a alma dela que ficou a penar pela terra, como castigo eterno.
Fonte: “Literatura Popular Tradicional na Gardunha”.
Imagem: pintura de Roque Gameiro (Minde, Alcanena, Portugal, 1864 – Lisboa, Portugal, 1935).
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