RENÉ
CREVEL
(Paris, França, 1900 – 1935)
O mais conhecido dos
escritores surrealistas é talvez Éluard, o mais surrealista dos escritores
surrealistas pode ser Breton, e o mais esquecido dos escritores surrealistas é
René Crevel. Mas mesmo com essas lacuna, o jovem René sempre teve grandes
adeptos entre minorias alternativas.
Crevel era um homem
torturado. Aos catorze anos, assistiu ao suicídio do pai, que se enforcou.
Surrealista fiel a André Breton, que tinha como um pai espiritual, era
tuberculoso e passou temporadas em sanatórios. Inquieto, andou pelas bandas da
psicanálise, mas continuava a sentir-se domador e fera de si mesmo. Tumultuoso
e frágil, escreveu em 1925 que a inteligência incita ao suicídio. Cumpriria
essa vocação dez anos depois.
Algumas das suas obras: Mon Corps et moi, La Mort difficile,
L'Esprit contre la raison, Le Roman cassé et derniers écrits.
in “Ecos do Nada” (excertos)
***
OLHAR
Teu
olhar cor de rio
É
água que muda, em arranjo
Com
o dia saciado no cenário.
Madrugada,
Vestido de anjo
Um
naco do manto celestial
Sob
teus cílios, entre as margens
Se
fez. Flui, flui viva água em paragens.
A
noite parte, mas o amor permanece
E
minha mão sente bater um coração.
A
alvorada quis adornar nossos corpos com sua acalmação.
Corpo-de-Deus.
O
desejo matinal retomou nossos corpos nus
Para
esculpir uma carne que acreditávamos cansada.
Sobre
os rios ao longe barcas já desancoradas.
Nossas
peles depois do amor têm cheiro de pão quente.
Se
a água dos rios está pelos nossos membros,
Teus
olhos lavarão minha alma;
Mas
teu olhar líquido ao meio-dia que eu temo
Se
transformará em chumbo?
Eu
tenho medo do dia, do dia pesado como um jumbo
Do
dia que sacia teu olhar cor de rio
Ou
numa noite pavimentada por gêmeos triunfos
Se
a vitória grita a volúpia dos anjos,
Revele-se nela a Majestade de um Ganges.
Tradução: Lucas Guimarães
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