ARY DOS SANTOS
(Lisboa, Portugal,
1937 - 1984)
Poeta e declamador
QUANDO UM HOMEM QUISER
Tu
que dormes à noite na calçada do relento
numa
cama de chuva com lençóis feitos de vento
tu
que tens o Natal da solidão, do sofrimento
és
meu irmão, amigo, és meu irmão
E
tu que dormes só o pesadelo do ciúme
numa
cama de raiva com lençóis feitos de lume
e
sofres o Natal da solidão sem um queixume
és
meu irmão, amigo, és meu irmão
Natal
é em Dezembro
mas
em Maio pode ser
Natal
é em Setembro
é
quando um homem quiser
Natal
é quando nasce
uma
vida a amanhecer
Natal
é sempre o fruto
que há no ventre da mulher
Tu
que inventas ternura e brinquedos para dar
tu
que inventas bonecas e comboios de luar
e
mentes ao teu filho por não os poderes comprar
és
meu irmão, amigo, és meu irmão
E
tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
fatias
de tristeza em cada alegre bolo-rei
pões
um sabor amargo em cada doce que eu comprei
és
meu irmão, amigo, és meu irmão
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