ANTÓNIO RAMOS ROSA
(Faro, Portugal,1924 – Lisboa, 2013)
Poeta,tradutor, desenhador
***
A Poesia
é um diálogo com o Universo
É raro encontrar em
Portugal estas grandes ondas de fraternidade que fazem, da solidão uma
habitação humana e onde os câmbios espirituais frutificam em estímulos,
orientações e obras. Tudo parece esgotar-se ao primeiro ímpeto, como se não
houvesse tempo e um juízo final estivesse já à porta para nos impedir a paz, a
serenidade e a confiança,sem as quais nada se pode realizar.
E depois, o poeta tem
sempre um olho no homem prático e vive no inferno dum complexo de justificação,
azedando até ao cerne da sua poesia onde tudo terá de ser alguma vez tranquilo
e mudo para que floresça.
Há o medo ainda de que o
chamem místico e, se dá em místico declarado, destempera nas grandes fórmulas
ocas ou nas apóstrofes patéticas.
A poesia como exercício
espiritual permanente é ainda alguma coisa que a maior parte dos poetas
portugueses ignora, seja porque são assoberbados pelas condições miseráveis da
sua vida, seja porque lhes atribuam uma primazia e uma fatalidade que elas espiritualmente
não têm.
O poeta que faz versos
raro se convence da seriedade do seu destino,sempre pronto às distracções da
violência, às impulsões fugazes do instinto, às solicitações da glorieta local
ou às subserviências de grupo.Se lhe dá para ser livre, brinca, asneia e cai na
graçola torpe; se aceita a revolta, ei-lo bizarro, falsamente frenético,
ocultista, com pretensões mágicas; se dá no lirismo, temos um conformismo
piegas, uma doçura limitada,etc.etc…
Há uma inconvicção, uma
fundamental insinceridade na maior parte dos que se dedicam à poesia (atesta-o um
doloroso panoramazinho de plaquettes extremamente líricas e cantantes);o gosto
de alinhar palavras ou rimas, o gosto das imagens independentes da necessidade
interior, o gosto de agradar aos amigos, o gosto de ir para as antologias, o
gosto simplesmente de ser publicado,que se fale de si, o gosto de escrever
qualquer coisa, - e raro o gosto por uma meditação essencial, por uma procura
da poesia, apaixonada e profundamente fraternal,e essa fidelidade interior que
é a marca indefectível do poeta.
in “Árvore - Folhas de Poesia” – 1951 (excerto)
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