JORGE DE SENA
(Lisboa,
Portugal, 1919 - Santa Barbara, Califórnia, 1978)
Poeta
***
ALGUMA
POESIA e outras considerações desagradáveis
A segunda série de Líricas Portuguesas, que o poeta João
Cabral do Nascimento seleccionou, prefaciou e anotou, destina-se a completar a
primeira série que foi organizada pelo poeta José Régio.
Trata-se de uma antologia
em que há poesia, em que todos são poetas, mais ou menos felizes na expressão,
mais ou menos espertos na «ideia»… Sente-se que a intenção foi quase sempre do
poeta, que achou grandioso, gracioso ou oportuno falar de algo, com a
sentimentalidade da ocasião , e comovido até às lágrimas da vaidade pelo
espírito do seu talento verbal.
Mas salvam-se: a suave e
dilacerante loucura de Ângelo de Lima; o populismo irónico de Afonso Duarte; a
feminina eloquência de Florbela Espanca; o isolacionismo trágico de José Régio;
a subtil rudeza de Miguel Torga; o pudor aparentemente áspero de Casais
Monteiro; a sátira parnasiana ao simbolismo que António Feijó ia fazendo, tal
como a raposa achava ainda verdes as uvas a que não chegava; o dramatismo
desastrado de Manuel Laranjeira; a angústia mortal de António Patrício; a
inspiração literária de Lopes Vieira; o cultismo pitoresco de Vitorino Nemésio;
o garcialorquismo minhoto de Homem de Melo; o sábio e viril formalismo de
Armindo Rodrigues; a melancolia provinciana de Alberto de Serpa: o discreto
arcadismo de Carlos Queirós; as recordações infantis de Alfredo Guisado; a
rebuscada simplicidade de António Botto; o dadaísmo inconsciente de António
Navarro; e ainda o encanto satírico de João Saraiva; o hieratismo exótico de
Osório de Castro; o erotismo retórico de Guedes Teixeira; a euforia
junqueiriana de João de Barros; o saudosismo depurado de Mário Beirão (que
escreveu «Ausências», poema incluído nesta antologia, e que é um dos mais
perfeitos da nossa língua); a paradoxal expressão, nunca assaz louvada, de
António de Sousa; o saudosismo diluído de Anrique Paço d´Arcos; a admirável segurança de João de Castro
Osório; o supra-realismo incipiente de Edmundo Bettencourt; a aristocrática
tristeza de Guilherme de Faria; o ultra-romantismo extemporâneo de Queirós
Ribeiro; a forçada inspiração de Silva Gaio; a amena limpidez de António
Fogaça; o António Nobre de S. Brás de Alportel que é Bernardo de Passos; o
Pascoaes de Olhão, que é José Lúcio; os delicados sonetos de Américo Durão; os
«incensos de oiro» de Luís de Montalvor; a «Violante de Cisneiros» de
Côrtes-Rodrigues; a «poesia em pessoa». que é Augusto Casimiro, como Vitorino
Nemésio lhe chamou algures; os sonetos acabados, como «tabatières à musique»,
na expressão de Claudel, de Cândido Guerreiro; o Diogo Bernardes e o
Cancioneiro Geral do Dr. Júlio Dantas; o violino de Ingres que são os versos do
notável prosador-poético Branquinho da Fonseca; o abastado bucolismo de
Francisco Bugalho; a circunstancialidade de Fausto José; o antigo panteísmo de
Correia de Oliveira; o delicado tradicionalismo de António Sardinha; a
inspiração edificante de Moreira das Neves; as excelentes qualidades recitáveis
de Fernanda de Castro; a renovada experiência de Campos de Figueiredo; e Cortês
Pinto, Júlio Brandão, Augusto Gil… Porque também lá não falta Augusto Gil, o
patriarca da «quadra popular» dos jogos florais e recreativos.
Citei, como se viu, os 50 poetas.
in “Mundo Literário” - 1946
Sem comentários:
Enviar um comentário