sábado, 11 de junho de 2016

AUGUSTO GIL – A Canção das Perdidas






Augusto Gil (Porto, Portugal, 1873 – Guarda, Portugal, 1929).

Diz-se que a sua poesia foi influenciada pela obra de João de Deus e por Os Simples, de Guerra Junqueiro. (…)
Toda a sua obra é muito permeável ao sortilégio do verso rimado e à atmosfera sentimental, misto de complacente e serena bondade, mais de raiz religiosa e afectiva do que política. (…)

Os seus versos de Balada de Neve e outros, ainda hoje soam como preces aos ouvidos de um povo que ama e sofre. (…)

O seu primeiro livro Musa Cérula foi publicado em 1894.

Outras das suas obras: Luar de Janeiro, Versos, O Canto da Cigarra, Sombra de Fumo, O Craveiro da Janela, Gente de Palmo e Meio.

A sua única obra póstuma, Rosas desta Manhã, foi prefaciada por Júlio Dantas.


Palavras de Augusto Gil:

«Nenhuma glória me cabe
a mim por muito escrever…
Eu apenas trabalhei
como uma abelha que sabe
que é fazer mel um dever,
que é um destino, uma lei.»



 in “Literatura Portuguesa”



*************



A Canção das Perdidas

Quem por amor se perdeu
Não chore, não tenha pena.
Uma das santas do céu
- É Maria Magdalena...

Minha mãe foi o que eu sou.
Eu sou o que tantas são.
Que triste herança te dou,
Filha do meu coração!

Meu pai foi para o degredo
Era eu inda pequena.
Se não morresse tão cedo,
Morria agora - de pena...

E há no mundo quem afronte
Uma mulher quando cai!
Nasce agua limpa na fonte,
Quem a suja é quem lá vai...

Aquele que me roubou
A virtude de donzela
Se outra honra lhe não dou,
- É porque só tive aquela!...

Nós temos o mesmo fado,
Oh fonte d'agua cantante,
Quem te quer, pára um bocado,
Quem não quer, passa adiante...

O meu amor, por amá-lo,
Pôs-me o peito numa chaga:
Deu-me facadas. Deixá-lo.
Mas ao menos não me paga!

Nem toda a agua do mar
Por estes olhos chorada
Daria bem a mostrar
O que eu sou de desgraçada!

Como querem ver contente
Este pais desgraçado,
Se dão só livros à gente
Nas escolas do pecado...

Dormia o meu coração
Cansado de fingimento.
Bateste-me, e vai então
Acordou nesse momento.

Se aquilo que a gente sente,
Cá dentro, tivesse voz,
Muita gente... toda a gente
Teria pena de nós!






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