domingo, 12 de novembro de 2017

FERNANDO GUIMARÃES - Poesia, Pintura e Realidade




FERNANDO GUIMARÃES
(Porto, Portugal, 1928)

Poeta, ensaísta, tradutor, crítico literário


POESIA, PINTURA E REALIDADE

A linguagem poética ou artística, que nada representa, aparece, entre todas, como aquela que está mais próxima do conhecimento do ser, na medida em que ela é, e não significa, o próprio ser. Tal linguagem é, pois, criação. O poeta, como criador, é de si que desvela essa realidade, não porque esta seja apenas ele, mas porque ela está também nele.

Neste momento, podemos perguntar se a pintura é distinta da poesia por ser não criação mas contemplação. A atitude do pintor seria contemplativa e, como contemplativa, distinguir-se-ia da do poeta que, como vimos, é criativa.

Enquanto um exprimia a realidade, o outro representá-la- ia. Uma das descobertas do artista plástico foi a cor. Mas a cor, ao ser descoberta, representa, não aquilo para que serve - porque então não seria já ela -, mas o que ela é em si mesma. Deste modo surge como linguagem, mas como essa linguagem nada nos representa além dela mesma, porque encontra em si a sua plenitude, podemos dizer que ela é, também, criação ou poesia. O mundo criado é a própria realidade. 

É aí, nessa realidade, que se encontram o autêntico religioso, ou seja, o místico, e todo o artista. Mas só este, estrangeiro entre os outros dessa realidade, pode dela regressar, criando-a. 

O religioso - pelo contrário – ficará inevitavelmente acorrentado à sua essencial ausência de limites. Por isso ele é, como diria Nietzsche, rico de mais para que possa dar.



in “Árvore” – revista literária


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