RAMIRO CALLE
(Madrid, Espanha, 1943)
Escritor
***
As
preferências do Divino
Um sacerdote passava frente a uma humilde aldeia. Ouviu
uns risos alvoraçados e aproximou-se para ver a que se deviam. Havia uma mãe a
dar de comer aos seus quatro filhos, mas o que surpreendeu o sacerdote foi ver
que também dava de comer a uma imagem da divindade.
O sacerdote irritou-se e
gritou: «Mulher blasfema, como te atreves a brincar com a imagem de Deus?»
Pegou na imagem e levou-a. Não podia permitir que fizessem dela um brinquedo.
As crianças ficaram muito tristes e a mulher envergonhada.
O sacerdote colocou
a imagem sagrada no templo. Essa noite, em sonhos, Deus apareceu-lhe e disse:
«Insensato! Quem te manda meter o nariz onde não és chamado? Não aceitarei
nenhum sacrifício nem qualquer oferenda dos sacerdotes, porque onde eu era
realmente feliz era naquela casa, com aqueles meninos. Portanto, assim que acordares
amanhã, leva-me a eles. O templo é escuro e triste.»
A solenidade
é o símbolo dos medíocres. O sábio tem um grande sentido de humor e o seu coração
transborda de ternura e seu entendimento, de compreensão. Uma religião que fecha
as portas à alegria e que não celebra a vida perdeu o seu sentido original de aliviar
o sofrimento e pôr a uso os meios para que as criaturas sejam mais felizes. Não se
chega ao Absoluto com oferendas vazias e rituais empedernidos, mas sim pela vontade
de contribuir para o bem-estar e a alegria dos outros.
in "Os Melhores Contos Espirituais do Oriente"
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