sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Barco Negro

 
 
 
 
 
 

                Barco Negro

 
De manhã, que medo, que me achasses feia!
Acordei, tremendo, deitada n'areia
Mas logo os teus olhos disseram que não,
E o sol penetrou no meu coração.

Vi depois, numa rocha, uma cruz,
E o teu barco negro dançava na luz
Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas
Dizem as velhas da praia, que não voltas:

São loucas! São loucas!
Eu sei, meu amor,
Que nem chegaste a partir,
Pois tudo, em meu redor,
Me diz qu'estás sempre comigo.
No vento que lança areia nos vidros;
Na água que canta, no fogo mortiço;
No calor do leito, nos bancos vazios;
Dentro do meu peito, estás sempre comigo.
 

 
 
David Mourão Ferreira (Lisboa, Portugal, 1927-1996) foi escritor e poeta.
Ilustração: quadro do pintor impressionista francês Claude Monet (1840-1926).

 
 
 
 
 

 
 

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