Maria Isabel Barreno (Lisboa,
Portugal, 1939).
Romancista,
poetisa, tradutora, ensaísta, novelista, contista, jornalista e artista plástica,
pertenceu ao Movimento Feminista de Portugal.
Foi autora, juntamente com Maria Teresa
Horta e Maria Velho da Costa, da polémica obra Novas Cartas Portuguesas.
Palavras de Maria Isabel Barreno
“Recriando a nós próprias, recriamos o mundo"
Excerto
do livro “ Célia e Celina”:
(…) Era uma vez uma menina. Vivia com
os pais, numa bela casa, junto a uma grande cidade. A casa ficava numa colina,
e daí via-se a cidade toda. Atrás da colina começava uma enorme floresta. A
menina ia passear à cidade, ia ao mercado, ia à escola. E passeava também na
floresta. Gostava muito de andar sozinha no meio das árvores das flores e dos
animais. Conversava com eles.
Um dia, viu uma fada. A fada não lhe disse nada,
olhou-a e sorriu. A menina também não disse nada, não ficou admirada nem fez
perguntas. Ela sabia que existiam fadas, embora ninguém falasse nisso. Naquela
terra as pessoas não falavam nas coisas mais importantes, porque essas as
coisas que existiam mesmo, e falando nessas coisas eles podiam sumir: ficariam
escondidas debaixo das palavras, esquecidas. A menina ficou olhando a fada, e
ficou feliz, completamente feliz. Sentiu que a visão da fada seria sempre um
sol na sua vida.
O
pai da menina era um comerciante abastado, e viajava muito por causa dos seus
negócios. Não era muito rico, mas ganhava bastante dinheiro, e todos viviam bem
naquela casa.
Um
dia em que o pai da menina deveria voltar de uma das suas viagens, não voltou.
A mãe e a menina esperaram-no toda a noite e ele não apareceu. No dia seguinte
soube-se na cidade que andava um bando de salteadores atacando quem passava na
estrada – na estrada por onde deveria ter regressado o pai da menina. (…)
Imagem: pintura de Ivan Shishkin (Rússia, 1832 – 1898).
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