Jaime Cortesão (Ançã, Cantanhede, Portugal,1884
- 1960
Médico, político, escritor e
historiador
Na
Universidade de Coimbra cursou Grego, durante um ano, e Direito, durante dois,
mas veio a trocar estes estudos pela Medicina. Concluiu a licenciatura em
Lisboa, em 1910, com a tese "A Arte e a Medicina, Antero de Quental e
Sousa Martins", após uma passagem pela Escola Médico-Cirúrgica do Porto.
Naquele
ano publicou o poema heróico A Morte da Águia, mas já antes desta
data havia editado poemas em periódicos de Coimbra e do Porto. As suas
poesias inscreviam-se no movimento literário do Saudosismo, igualmente patente
nos dramas históricos que compôs: O Infante de Sagres, em 1916, Egas Moniz, em 1918, e Adão e Eva, em 1921. (…)
Dedicou-se
à Poesia e a programas de intervenção cívica educativa e cultural, nomeadamente
através da "Renascença Portuguesa" (1912), da "Universidade
Popular do Porto" e da Revista "A Vida Portuguesa" (1912-1915),
da qual foi director e na qual entrou em polémica com António Sérgio. Mais
tarde, em 1921, associou-se à revista "Seara Nova" (1921), publicada
em Lisboa, com Raul Proença e Câmara Reis, mas veio a abandonar este movimento
tal como antes tinha feito com a "Renascença Portuguesa".
Politicamente
simpatizava com os ideais anarquistas e defendia o republicanismo democrático.
Ingressou na Maçonaria, em 1911, envolveu-se no movimento revolucionário de 14
de Maio de 1915 e entrou na Guerra de 1914-1918 como voluntário do Corpo
Expedicionário Português, no posto de capitão-médico miliciano. (…)
Em
1919 foi nomeado Director da Biblioteca Nacional de Lisboa. (…)
Esteve
preso em Peniche e no Aljube, partindo, em seguida, para o Brasil, país onde se
manteve até 1957. (…)
No
Brasil, além de dar continuidade aos trabalhos históricos, colaborou em
periódicos, proferiu conferências, regeu cursos e organizou a Exposição
Histórica do IV Centenário de S. Paulo, que lhe valeu o título de cidadão
benemérito. (…)
Jaime
Cortesão é uma das mais insignes figuras da cultura portuguesa de meados do
século XX, a par de Raul Proença e de António Sérgio. Revelou-se um proeminente
intelectual, político e homem de intervenção cívica, e um grande historiador,
um personagem ímpar que deixou uma extensa obra, repartida entre a literatura,
a poesia, o conto e o drama, e a história, portuguesa e brasileira.
in Universidade do Porto
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Maldição
Por ti, pelo teu ódio à Liberdade
à Razão e à verdade,
a tudo o que é viril, humano e moço,
a fome e o luto apagaram os lares
e os homens agonizam aos milhares
no exílio, no hospital, no
calabouço.
Por ti raivoso abutre
cujo apetite sôfrego se nutre
de lágrimas, de gritos, de aflições
gemem nas aspas da tortura
ou baixam em segredo à sepultura
os mártires que atiras às prisões.
A este claro povo, herói dos povos,
que deu ao Mundo mundos novos,
mais estrelas ao céu, mais luz ao dia;
a este livre e luminoso Apolo
atas as mãos, os pés e o colo,
e encerras numa lôbrega enxovia.
Falas do céu, como um doutor no templo
mas tu encarnação e vivo exemplo
da hipocrisia vil dos fariseus,
pelos sagrados laços que desunes,
pelos teus crimes, até hoje impunes
roubas ao mesmo crente a fé em Deus.
Passas...e mirra a erva nos caminhos,
as aves, com terror, fogem aos ninhos,
e ao ver-te o vulto gélido e felino,
mulheres e mães, lembrando os lastimosos
casos de irmãos, de filhos ou de esposos,
bradam crispadas as mãos: Assassino! Assassino!
Passas... e até os velhos, cujos anos
têm costumado a monstros e tiranos
dizem, com a boca cheia de ira e asco:
-Sobre esta Pátria mísera que oprimes,
jamais alguém foi réu de tantos crimes.
vai-te! Basta de vítimas!
Carrasco!
Passas... e ergue-se, vai de vale a cerro
dos hospitais, do fundo das masmorras
às inóspitas plagas do desterro,
um coro de ais, de imprecações, de morras.
São multidões que rugem num só brado:
- Maldita a hora em que tu foste nado!
-Que se malogre tudo quanto almejas;
-Conturbem-se os teus dias de aflição,
neguem-te as fontes água, a terra pão
e as estrelas luz -Maldito
sejas.
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